Por Esther Lucio Bittencourt
Capa da primeira edição de "O Cruzeiro"
Quando trabalhava como freelancer no "O Cruzeiro", havia reunião de pauta por volta das 17, 18 horas, se não me falha a memória. Em seguida era a hora de comer alguma coisa, ou seja, para quem estivesse em casa era hora de jantar.
Já havia trocado o horário das minhas refeições. Almoçava na hora do café da manhã; por volta das 14 horas bastava um sanduíche para saciar algum resquício de fome. E depois era correr o dia, a noite, que fome não batia nem sono.
Olha, a memória falha, mas acho que ficava na Rua do Livramento, gráfica e as demais revistas do Chateaubriand. Era o final de uma época.
Tudo muito escuro e gasto pelo tempo mas lembro nitidamente de um cartaz na parede: "O verdadeiro repórter é um eterno foca" , frase cunhada pelo dono do império.
O cheiro do cigarro, das guimbas mal apagadas nos cinzeiros, a agitação diferente da que havia nos jornais que estariam fechando àquela hora e o telex, sim era telex, gritava desesperado notícias do mundo, as chefias de reportagem brigavam com os repórteres que brigavam com as máquinas de escrever olivetti e os parcos telefones, existia no cheiro do suor dos homens cansados. Nada igual em revista, no entanto, muito parecido.
Mas, como contava, era necessário comer. Após a reunião de pauta ia para um restaurante pé sujo que ficava bem perto, na mesma calçada e comia um belo bife a cavalo com fritas e arroz. Em seguida voltava para a redação.
Era freela e, não sei porque, precisava dar horário e cumprir pauta. Coisa mais doida.
Mas vá eu atrás da memória recolhendo cacos que sobraram de antes da prisão no doi codi de São Paulo.
Pois foi assim que ouvi esta música de João Bosco cantada por Elis Regina, num momento de correria pela redação, já noutro tempo em jornal, que salivei.
O sabor do bife a cavalo com fritas sombreia até hoje em minha boca, mesmo neste tempo em que não como carne.
Havia mais o feijão e arroz com alface e macarrão e nenhum queijo com goiabada cascão. E mulatas chamadas Leonor ou Dagmar também não conhecia.
Mas a música, ah, esta música é refrão de meus tempos de muito mas muito mesmo, trabalho.