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O eu não existe. Imagina a angústia que
isso gera para os que acreditam no contrário? Haja confronto psicológico, pois
a maioria das pessoas é criada para ser digna, merecedora - quase que como
consequência - de um eu feliz, ético e bem-sucedido.
No entanto, estarão os
orientais à frente do tempo? O budismo há vários anos fala da não existência do eu. E por que, ocidentais, não
aceitam tal hipótese? Por que há sempre um desconforto nessa afirmação? É como
se passássemos a não existir e tudo o que fizemos e dizemos fosse mera ilusão?
A desconstrução de Descartes, afinal, se o eu não existe, o que faço aqui?
Máscaras, simulacros e
imagens. Daí, os tantos labirintos. Estes mesmos que muitos enveredam com
sofreguidão à cata de alguém que verdadeiramente o ame e entenda. Mas como
realmente encontrar esse alguém se não passamos de máscaras somadas a outras
máscaras que nunca formam um rosto?
Por outro lado, isso
explica frases comuns de se ouvir: "na verdade, nunca sabemos em quem
confiar, nunca sabemos como realmente são as pessoas". Na realidade, nunca
sabemos quem nós mesmos somos e do que somos capazes de fazer. Em síntese,
somos tudo e nada. Uma voz ecoada no abismo da solidão e outra no pico da
montanha mais alta, onde o sol adormece por entre as matas. O que vemos é
sempre uma pequena parte do todo. É a meia-verdade que
Drummond tanto se referiu em vida.
Somos máscaras e não
rosto. Temos cenas, mas não diretores ou atores. Os pensamentos independem do
ser — e é fantástico.
Para quê então nos
preocuparmos tanto? Para quê a pressa se tudo é tão efêmero? Tanta neura, tanto
estresse, tanta depressão, a troco de quê?
Se felicidade é o que
se deseja da vida, imagine fazer apenas o que se gosta, e não o que às vezes se
vê obrigado a executar. Sem culpa, condenação, julgamento, preconceito: a busca
somente pelo bem-estar e pelo prazer.
O filósofo grego
Epícuro elucida isso muito bem ao dizer que é preciso saciar a carne e obedecer
sem restrição aos desejos — sem culpa, sem pecado e sem castigo. Fazer o que se
gosta com quem se sente bem. Mesmo porque o desejo é a energia que satisfaz os instintos
mais básicos e primitivos.
O importante é vivermos
— conscientes de nossa máscara real — sem nos preocuparmos com as grandes (e
talvez eternas) buscas de amor ou de justiça. Sem buscarmos o que é conceitual,
mas não real. E principalmente, sempre lembrarmos que poderemos ser até
protagonista de uma determinada história, mas que isso não nos livra de sermos
sempre personagens.