quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

A ARMADILHA DO SENHOR P

Claudia Lopes Borio

Eu sou daquelas pessoas que nunca ganham sorteio, rifa, loteria, nada.  Nunca. Nem bingo, nem raspadinha. Quando acho uma pulseira de ouro no chão, é falsa.  Mas enfim, outro dia almocei num lugar diferente e tinha um formulário para preencher, concorrendo a um brinde, e lembrei-me da minha mãe, que sempre ganha: ganhou um aparelho de som num concurso dos Chicletes Adams, ganhou uma bolsa Vitor Hugo numa rifa, sonhou com jacaré, jogou no bicho, ganhou quinhentos reais. Enfim, ela diz: se você não jogar, nunca vai ganhar. Então preenchi o dito formulário e coloquei na urna. Um certo tempo depois, recebo um telefonema persuasivo (eu já devia ter começado a desconfiar): a senhora foi premiada na promoção dos hotéis P., por favor passe aqui tal dia, tal hora, para receber suas cortesias e brindes.

No dia marcado, estava morrendo de preguiça, com um começo de gripe que me deixou meio derrubada, novamente me liga uma moça super educada para confirmar o horário marcado e dizer que o estacionamento era grátis. Começava a ficar irresistível o negócio. Lá fui eu para o chiquérrimo hotel P., com minha saia de listinhas, um lenço dentro da bolsa. A recepção era gélida, devia estar fazendo uns 10 graus, enquanto o clima reinante em Curitiba era de uns 30 graus, o choque quase faz trincar minhas obturações. Que horror, minha gripe piorando a cada segundo, sentei-me para esperar a recepcionista, o consultor, sei lá mais o que. Daí aparece a recepcionista, me faz mais umas perguntinhas para confirmar se eu sou eu e diz que terei que assistir a uma breve apresentação para ganhar meu brinde, tudo bem? A essas alturas faço qualquer coisa para sair daquela sala gelada e concordo.

Vem outra mocinha, toda educada, e me leva por uma escada vazada, de metal, que eu detesto, para uma sala onde começa a me mostrar fotos de revistas sobre os hotéis P., como se eu sofresse de algum retardo mental ou se fosse um teste de Roschach para ver se eu queria viajar. Ela segura a revista de um jeito muito engraçado, como se eu fosse uma criança, e vai virando as páginas sem olhar. Aquilo já começa a me dar nos nervos.  Ela pergunta sobre minhas viagens e se surpreende ao ouvir aonde eu já fui – será que tenho cara de jacu, meu Deus. Aí pergunta onde eu gostaria de ir, lasco uns destinos esquisitos – Vietnã, o Butão, a Ilha da Páscoa. Pergunta se eu tenho namorado e para onde ele gostaria de ir, bom, imagino que a vila de Arraiolos em Portugal, a cidade de Hamelin na Alemanha, ou talvez Carcassonne, na França. E a sua filha, ah você tem uma filha... bom, ela quer ir para Liverpool, para Cartagena, para São Francisco da Califórnia.

A moça prossegue, impávida, me mostrando todos os hotéis do grupo P. no Brasil. Confesso que fico fascinada com as páginas da revista que ela vai virando de ponta-cabeça para eu olhar, e com o repartido do seu cabelo, que é atravessado, e o cabelo muito liso, como se fosse uma noz que vai se partir no lugar errado se apertarmos com um alicate. Se ela soubesse como detesto hotéis e como não tenho a menor vontade de ir para nenhum desses lugares!  O hotel de Natal, então, me dá vontade de vomitar, parece um tijolo cravado sobre uma montanha de terra em forma de pirâmide achatada. Eca!
Acontece que senhor P. me oferece, veja só que privilégio, a oportunidade de comprar um pacotão de viagens que vai me permitir usar todos esses hotéis!!! Veja que maravilha, que êxtase, que bênção, são apartamentos para até quatro pessoas (hã?) e tem em todos os lugares do mundo - bom, não tem no Vietnã, nem na Ilha da Páscoa, mas tem na vila de Arraiolos, veja só!! Puxa, que azar, penso. Ah, entendi, é uma espécie de lavagem cerebral, reunião de tupperware hoteleira, Herbalife do mundo das viagens. Lembro-me daqueles produtos de limpeza, como era mesmo, Amway. Aha. Mas que coisa de pobre, tenho vontade de dizer a ela. Mas nem café da manhã tem? Começo a fazer uma continha mental e vejo que o fantástico pacote não é assim tão vantajoso.

Ah, meu deus, porque é que eu fui falar em Arraiolos, penso, procurando Hamelin no mapa da Europa que ela me mostra de ponta-cabeça, folheando furiosamente a revista. E digo a ela que, sinceramente, não penso em comprar o tal pacote.

Mas por quê??? Ela pergunta tão aflita.

Ora, por que não gosto, respondo.

Entra uma gerente para confirmar se está tudo bem, com cara de vampira, grandes olhos ávidos, pulseira tilintante de ouros e um anel imenso que me lembra uma palmatória. Ela também me mostra a revista de ponta-cabeça e faz contas numa calculadora também de ponta-cabeça, que impressionante isso! Será que elas treinaram no  Cirque du Soleil?  Compre o pacote tupperware, fique sócia do senhor P. e faça amigos para sempre!! Este programa sensacional dura por quinze anos, a senhora já pensou nisso, diz ela agressivamente.

E se o senhor P. for à falência enquanto isso, já que ele usa o dinheiro tupperware dos viajantes para comprar mais hotéis, eu faço o que com as minhas milhas, bônus, cupons, seja lá o que for, pergunto?
Hahaha, ela ri, com dentes de vampiro, mas isso não vai acontecer, o senhor P. é sólido. Não sei, não li os relatórios financeiros do grupo, mas isso me parece um pouco com aquelas histórias de criar avestruz ou de investir em gado, digo a ela.

Mas ora, então eu posso lhe oferecer mais vantagens, mais descontos, menor preço. Menor preço? Mas custa quase o mesmo que um apartamento à beira mar em Florianópolis, que eu posso comprar à vista e alugar por R$ 10.000,00 por dia na alta temporada, minha senhora. Eu também sei fazer conta.

A mulher começa a suar e me oferece então o máximo da mordomia, eu parcelo em trinta vezes! Ah, tristes brasileiros que acham que a dívida parcelada vai desaparecer. A essas alturas eu já estou me sentindo como uma pessoa que foi enviada pelo senhor P.  para testar o poder de persuasão das moças. O repartido torto da primeira mocinha, cujo pai queria que ela fizesse direito e não turismo, já está totalmente descabelado. Bem sabia o pai dela: isso se chama “vendas”,  e não turismo, minha filha.

E a outra está com os dentes cada vez mais arreganhados, daqui a pouco vai pular por cima da mesa e me bater com a grossa revista dos destinos internacionais, toda colorida em papel brilhante, inconformada pois eu não quero comprar os tupperwares do mundo das viagens, não quero ir para Ilha da Madeira nem para Miami, oh céus!! E como é que a senhora vai me oferecer um pacote, se não tem hotel na Ilha da Páscoa, nem no Butão? Mas então, eu lhe dou café da manhã de graça! Mas que droga, não tinha café da manhã? Ufa, ainda bem que eu não comprei.

A gerente, desconcertada, pergunta, afinal, como é que eu faço para viajar, quando quero?

Pago à vista, minha senhora, respondo do alto de meus sapatinhos da Side Walk, pego minha revista colorida, meu vale dois dias e uma noite em um hotel da rede P., sem café da manhã,  brinde mixuruca que eu acabei ganhando,  e vou embora absolutamente exausta e sem a menor vontade de nunca mais ouvir falar do senhor P.

Ao sair da garagem, folhas voam, em redemoinho perfeito. Um saci pererê que está rindo da minha cara.


Claudia Lopes Borio é escritora em Curitiba. Quando viaja fica hospedada em casa de amigos.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

QUITANDA DA VIDA

Telinha Cavalcanti

O objetivo de hoje não é enfiar o pé na jaca. É derrubar a jaqueira :D

PAVÊ DE BIS


Ingredientes

1 lata de leite condensado
1 litro de leite
4 colheres (sopa) de amido de milho
2 ovos separados
2 caixas de chocolate Bis
1 xícara de açúcar
1 lata de creme de leite
1 pitadade sal


Modo de Preparo

Misture o leite condensado, o leite, a maisena, as gemas e leve ao fogo, mexendo sempre, até engrossar - reserve.
Forre o fundo de uma forma refratária grande com metade do creme, faça uma camada com o chocolate e complete com o restante do creme.
Bata as claras  em neve (coloque uma pitada de sal, ajuda a firmar) e acrescente o açúcar, aos poucos, batendo sempre, até obter um suspiro bem firme.
Junte o creme de leite e mexa bem. Não deixe desandar.
Coloque essa mistura por cima do creme e leve à geladeira até a hora de servir.


Receita e imagem: Tudo Gostoso 

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

A liberdade doente





Os convites para sites de relacionamento e chat, que chegam todo dia no e-mail da gente, em geral vêm em nome de alguém de nossa lista que pode não ser o autor da mensagem. Não são somente os vírus e spams declarados que chegam assim. Vêm em tom invasivo e falsamente descontraído, mas não passam de marketing descarado, já tão incorporado a nosso dia-a-dia que às vezes nem nos damos conta. Por que estranhos a léguas de distância estariam preocupados em nos trazer de volta amigos extraviados ou antigos colegas de escola e de trabalho? Quase sempre o mesmo pretexto para oferecer produtos supérfluos, serviços que ninguém pediu e outras mercadorias perfunctórias, esse tipo de mídia eletrônica onde piscam mil e um patrocínios de construtoras, lojas, hotéis, carros, utilidades, inutilidades, garotos(as) ou amigos de programa, que em certos casos pagam para se ofertar via internet.

Cada vez mais forças externas tentam dirigir os atos que deveriam ser de iniciativa exclusiva de cada um. Isso lembra muito 1984, de George Orwell, ou Admirável mundo novo, de Aldous Huxley. Outro dia, revendo Zorba, o Grego (que filme!), e vendo os camponeses de Creta esperando a morte de Hortense para saquear sua casa, pensava na analogia entre aquela cena e a constante intrusão de empresas e pessoas que insistem em nos convencer de que o melhor para nós é o que eles querem – e eles sempre querem nos passar alguma coisa em troca de nosso dinheiro e/ou nossa submissão para fomentar seu poder.

Por conta dessa luta de interesses, que se disfarça de luta de ideias, este mundo às vezes parece um grande manicômio. O inconsciente coletivo virou um amontoado de noções sem fundamento e preconceitos distorcidos explorados por aventureiros. Diante destes, os sofistas da antiga Grécia eram seres sem malícia. Nos anos 1960 passamos por um período em que as ideologias se digladiavam e geravam debates e contendas sem fim. Agora porém as ideias e visões de mundo chegam aos pedaços, mal assimiladas e achacadas pelo mercado, pelos políticos e por aquele tipo de gente que corre atrás da fama a qualquer preço.

O lado virtuoso da comunicação em tempo real, que chega da televisão e da internet, traz em seu bojo dois vícios capazes de anular grande parte das vantagens de tanta rapidez: a informação chega muitas vezes mal elaborada e quem a recebe na outra ponta quase sempre deturpa seu sentido, por estar mal preparado ou desinformado de dados anteriores, sem os quais a notícia perde seu sentido principal. Diante disso, a mentalidade do público em geral flutua entre juízos precipitados e dúvidas sem resposta; e grande parte das pessoas desiste de entender e se acomoda na alienação, ou então assume uma atitude irracional diante dos acontecimentos.

Quem sabe ajudava reunir de novo na praça os pensadores, os artistas e o povo, como faziam os antigos gregos na ágora? Quem sabe ainda se consegue plantar em nossas cabeças a semente de uma reflexão sem compromisso com os interesses do dinheiro, do poder e da violência? A liberdade humana é um conceito pouco claro, porque, em qualquer caso, é sempre muito limitada. Mas sem essa reflexão, a liberdade de cada um de nós se reduz a miragem, palavra vazia do vocabulário politicamente correto, e só.

domingo, 27 de janeiro de 2013

SENHORA DO TEMPO - IL TIRABUSCIÒ

Vera Guimarães

Amigas queridas costumam me trazer lembrancinhas de suas viagens. São blocos de anotação, gloss, elaboradas lixas de unha, marcadores de páginas, calendários, chaveiros, tudo a atestar que se lembraram de mim. Que bom!

Acabo de ganhar lindo ímã de geladeira em forma de tropical sandália, provido de abertura que funciona como abridor de garrafa! Adoro!

Nas décadas 1970/1980, minha filha mais velha e eu fizemos uma coleção de abridores de garrafa. Tudo começou quando, arrumando gavetas, encontrei duas peças que meu marido trouxe na bagagem de volta ao Brasil depois de dois anos de pós-graduação na Europa. Um abridor era uma medalha de Luís XIV e o outro era uma peça de bronze em forma de máscara de teatro grego.




Aí comecei a prestar atenção em abridores de garrafa. Ao me deparar com algum interessante, comprava-o. Ao dizer a algum amigo que colecionava abridores, provocava no (ex-) dono do objeto a obrigação de mo oferecer. Que cara-de-pau, eu! Assim ganhei um lindo gato de metal fundido, bem anos 1950, o animal em posição de estranhamento, o rabo em espiral, pronto para sacar uma rolha! Obrigada, Dilza! Ganhei também um abridor enorme, tipo lembrança de Itu, do colega Mário César. E outro, um chaveirinho-abridor incrustado com peça de porcelana azul e branca de Delft, de Maria do Carmo Quintão. E muitos outros, de muitos amigos. Por onde andarão? Os amigos, bien sûr, dos abridores eu sei.

Voltando à nossa coleção, minha filha e eu nos tornamos obsessivas na busca por abridores. Em viagens, procurávamos por eles. Uma vez, numa loja sofisticada de um aeroporto, vi lindas peças esmaltadas. Perguntei o preço dos dois na vitrine e escutei algo assim: Quienzvint. Perguntei qual custava quinze e qual custava vinte. A moça, bem blasée, esclareceu: “Quinhentos e vinte cada.” Ah, tá! Realmente eram lindos, de uma artista, e comprei um, em tons de cobre.
Colecionismo vira fissura. Passamos a comprar abridores comuns, e passamos a oferecê-los em bares, restaurantes e até em carrocinhas de lanche em troca dos deles. Assim conseguimos abridores de Fanta, Grapette e até daqueles engenhosíssimos feitos de um pedaço de cabo de vassoura ao qual se aplica um parafuso.

Nossa coleção mostrava lindos abridores em forma de peixes, caranguejos, leões, passarinhos; havia barcos, casinhas, moinhos; tinha também aqueles alusivos a uma cidade, bem baranguinhos, estampando todos os monumentos; outros eram comemorativos de algum evento, a coroação da rainha, o jubileu de prata da Feira de Animais; e infinidade de abridores promovendo marcas comerciais.   

Em fins da década 1990, em Veneza, na hora de escolher um restaurante, entre dois desconhecidos, optamos pelo Il Tirabusciò, saca-rolha em italiano, pelo menos falava de algo familiar. Do lado de dentro da porta do meu armário antigo, costumo colar cardápio, porta-copo ou qualquer outra referência a restaurantes de que gostei. Olha ele aí.



Hoje os abridores estão com minha filha. Conservei comigo apenas os de especial estimação, aqueles da foto, e outros que pertenceram à velha cozinha de minha mãe.

Selecionei alguns links bem interessantes sobre abridores. Passeiem por eles e divirtam-se!
  
Não Somos Apenas Rostinhos Bonitos
Cervisiafilia 
Musée Gourmandise

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

CACOS DE PORCELANA AZUL



Claudia Lopes Borio


Cacos de porcelana azul

Cacos de porcelana azul,
Olhos azuis, renda
Altruísta do tempo
Válvulas no coração de uma baleia,
Uma praia ossos brancos,
E árvores que balançam lentamente
O mar, senhor
Exigente de tantas mulheres
E cacos de porcelana azul,
Renda de bilros bordada sobre
Partitura
Com espinhos de cactos
Mão de mulher velha, o sol
Exigente senhor
Louças da Companhia das Indias
A companhia das índias era boa
Para os homens brancos
Ensinaram a tomar banho
O sabão, em um pratinho
O azul vem do cobalto
Segredo chinês
E a louça se foi em cacos,
Delicados, gastos pelo mar,
Exigente senhor!
Que as rolou para cá, e para lá
Até uma praia, após uma baleia
Cujo esqueleto jaz em museu
Baleia é grande, Jonas tinha razão
Só a cabeça é ...
De um tal tamanho
E na praia, os cacos chegaram
Gastos, já de tanto rolar
Mulheres que faziam renda
Praia do forte, o sol, exigente
Senhor, quebrou em cacos
A louça, tão azul, os olhos,
Que leram as partituras
Em rendas de bilros
E músicas antigas, porcelanas
Da companhia
Das índias.


terça-feira, 22 de janeiro de 2013

QUITANDA DA VIDA

Telinha Cavalcanti


Férias. No Rio, faz sol, faz chuva, faz casamento-de-viúva. E nessa preguiça de janeiro, um cláaaassico das multidões: biscoito casadinho de goiabada!

Casadinho de goiabada

Ingredientes:

Biscoito
3/4 de xícara de chá de margarina
1/2 xícara de chá de açúcar
1 ovo
2 xícaras de chá de farinha de trigo
margarina para untar a fôrma

Recheio
1 xícara de chá de goiabada picada
2 colheres de sopa de água


Como fazer o biscoito
Bata a margarina e o açúcar até formar um creminho. Acrescente o ovo. Junte a farinha de trigo e misture, com as mãos, até obter uma massa homogênea. Divida a massa ao meio, abra e enrole como um rolinho. Cubra com plástico-filme e leve à geladeira por uma hora.

Retire, corte em fatias e coloque na fôrma untada. Leve ao forno médio, pré-aquecido, até dourar (em torno de 8 minutos, mas depende do seu forno). Retire e deixe esfriar sobre uma grade, para que o ar circule bem e o fundo do biscoito não fique embatumado.

Como fazer o recheio

Leve a goiabada com a água em uma panelinha no fogo médio. Mexa bem até que derreta. Deixe esfriar e cubra metade dos biscoitos, cobrindo com a outra metade. Polvilhe açúcar por cima.

Imagem: Blog Sabores do Mundo

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Do miniblog



                                             Imagem da internet, sem menção de autor.


Solidariedade + empatia + calor humano + cumplicidade = amizade – o metal mais raro e mais imitado na história da humanidade.

Eu vi: no meio da cidade violenta, um pombo sozinho atravessando a rua na faixa.

To follow, or not to follow, that's the Twitter.

De Augusto Monterrosso: "Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá." Prêmio de melhor miniconto.

TOC eletrônico é sem remédio. Cada era tem a torre de Babel que merece, né não?

Aranha malhada tem pernas grossas (provérbio tibetano).

Respeito todas as religiões, mas não entendo nem aceito alguns religiosos que não respeitam as convicções alheias.

Autocontrole é saber que espaço cada pessoa pode ocupar em sua vida e que palavras usar para lhe dizer o que pensa sem magoá-la.

Você muitas vezes não vê o que pensa que vê, e esse tem sido o motivo de tantos equívocos e desentendimentos entre os humanos.

Incentivar a leitura é coisa séria, e no Brasil é uma necessidade - a gente cresce pela leitura.

Bom senso informa: nem todo médico faz bem à saúde! Em casos complicados, consulte pelo menos três e adote práticas alternativas.

Político honesto é aquele que só se vende duas vezes se o primeiro comprador morrer antes dele.

Era uma menina de tornozelo irado, corpo malhado e cabeça feita. O que estragou tudo foi o coração mole.

Dentro do Brasil, tantos brasis; nos EUA, tantos euas; na China, tantas chinas. Dentro de cada pessoa, tantas pessoas.

Ser gente da melhor qualidade dispensa qualquer rótulo.

Ingratidão e burrice são amigas inseparáveis. Pode conferir.

Gostar é fácil, mas é preciso mais que isso pra conviver. A rotina carrega uma mochila cheia de camundongos esfomeados. Nada contra a rotina, até gosto dela. Mas que os camundongos são um risco, ninguém pode negar. O nome deles explica: o chefe do bando se chama egoísmo, mas há outros nomes significativos, como grosseria, comodismo, indiferença, interesse e deslealdade.

A internet é uma floresta, mas há clareiras que vale a pena conhecer.

Baby, flanar não tem nada a ver com flanela.

Segredo revelado é uma verdade que usava burca e virou stripper.

Testou o equilíbrio quando a megassena acumulada saiu pra ele sozinho. Passou a ter vertigem de altura.

Solidão é ver tudo nos lugares e ninguém para desarrumar.

Ser simples não é ser primário nem carente nem pobre. Ser simples é um charme que pouca gente conhece. E muitos não conseguem entender. Pena.

Arrogância são duas pernas de pau cheias de cupim.

A vida é um encontro marcado ao qual é melhor não faltar, porque não há outra chance.

Perdeu todas as boas oportunidades por dar importância demais à opinião dos outros. Nesse particular, saber usar a sintonia fina é decisivo.


domingo, 20 de janeiro de 2013

SENHORA DO TEMPO: ACORDANDO

Vera Guimarães

Certa amiga, retornando de circuito envolvendo Washington, New York e Miami em curto espaço de tempo, diz que nem sempre sabe onde está acordando.  Ao acrescentar a esse roteiro a Carolina do Norte, onde passou dois meses, chegou a dizer que não sabia direito onde era a casa dela.

Minha mãe também era assim. Tinha declarada afeição por viagens, relatada aqui. Guardadas as devidas proporções do perímetro do périplo, no caso da minha mãe às vezes circunscrito a Sete Lagoas, Jequitibá, Pirapama, chácara da irmã  e fazenda do irmão, isso não vem ao caso, o fato é que ela se perguntava ao acordar: Onde estou? 

Eu também sou acometida desta e de outras confusões envolvendo sensações espaciais. Em cidade desconhecida, quando vejo que minha simples percepção não basta para me levar de volta ao hotel, tenho que apelar para a lógica irretorquível: confiro se a numeração da rua sobe ou desce, boto o mapa no chão e sigo naquela direção, morta de medo, contrariando meus fracos instintos. Ufa, cheguei ao hotel, veja, mamãe, sem as mãos!

Hoje com certeza esse transtorno já foi classificado, nomeado e tem tratamento. Acho que não preciso, convivo bem com ele.

Ademais, tenho gostado muito de passeios que envolvam barco em rios. Por mais cidades que eu visite, minha cama é sempre a mesma.



Se barco não for possível, o máximo que pode acontecer é eu acordar em Amsterdam e reclamar: Uai, a Oude Kerk estava do outro lado ontem à noite!


Imagens:

Mapa de Washington: www.viaje.es
Amsterdam: wikimedia

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

PAÇO DA LIBERDADE: UMA LIÇÃO EM REVITALIZAÇÃO

 Nossa repórter Claudia Lopes Borio relata a revitalização do Paço da Liberdade, em Curitiba - uma iniciativa a ser aplaudida e reproduzida Brasil afora...

 Paço da Liberdade - Uma lição em revitalização

Claudia Lopes Borio

Um canto esquecido da cidade, um velho espaço onde o lixo se acumula, as pessoas passam entristecidas, viciados fumam o craque abertamente e a paisagem toda está triste e acinzentada. Infelizmente, esse quadro ocorre em muitas cidades brasileiras, especialmente nas mais antigas.

Para tentar remediar essa situação, modernamente vem se falando em “revitalização”, ou seja, o governo arregaça as mangas, retoma a posse daquele espaço e, através de parcerias, incentivos fiscais e várias ações, que podem ser bem simples ou muito complexas, faz o espaço voltar a ser bonito, alegre, funcional, limpo e seguro. Essa ação, que realmente injeta nova vida em várias partes da cidade, traz uma conseqüência imediata: a população volta a usar o espaço com alegria, o comércio melhora os lucros, mais pessoas conseguem emprego, os ônibus de turismo voltam a circular na área, há mais segurança para os moradores, e surgem novas atrações e atividades possíveis.


Tal é o caso clássico do Pelourinho de Salvador, na Bahia, um dos primeiros espaços onde se falou em “revitalização”. No entanto temos um exemplo mais próximo de nós, aqui no Paraná,  que pode ser apreciado por todos. Trata-se da Praça Generoso Marques, no centro da cidade de  Curitiba, onde por muitos anos ficou fechado e praticamente abandonado o prédio que foi Prefeitura e Museu Paranaense. Os ônibus expressos passavam ali pela Rua Riachuelo, provocando barulho, poluição sonora e aérea. O comércio estava entristecido, as calçadas estragadas e a região tomada pelo tráfico, prostituição, sujeira.

Eis que, após várias tentativas, finalmente uma parceria com o Sesc-Fecomércio conseguiu restaurar o velho prédio, originalmente inaugurado em 1916.


O prédio que hoje se chama “Paço da Liberdade” era a  antiga sede da prefeitura de Curitiba, construída próxima da Catedral Metropolitana. Um prédio belíssimo, construído no estilo “art-nouveau”, tem muitos ornamentos que atraem o olhar da pessoa que transita por ali, mesmo que não se interesse por arquitetura: o belo telhado com telhas de ardósia, as torrinhas com um pára-raios em ponta, as figuras de Hércules que seguram as varandas, as grades de ferro antigas e toda a fachada com uma dignidade imensa transmitem uma sensação de beleza e equilíbrio. As janelas com esquadrias ornamentadas, fazendo desenhos em curva, são tema freqüente de fotografias dos turistas. Todos os detalhes do prédio foram preservados de maneira a conservar ao máximo as características originais, já que o edifício foi tombado pelo Patrimônio Histórico da União.


O trabalho de restauração não cuidou apenas da fachada externa, mas teve uma verdadeira “arqueologia” interna, respeitando detalhes originais, descobrindo como foi feita a construção e acrescentando várias inovações onde não era possível restaurar.

Assim, o prédio, que foi rebatizado de Paço da Liberdade, recuperou toda a sua beleza e passou a abrigar um café do Sesc, além de salas para uso de internet, espaço para exposições e eventos, e biblioteca. O nome “Paço da Liberdade” lembra as mudanças democráticas pelas quais o país vem passando, além de se inspirar no antigo nome da rua Barão do Rio Branco, que se chamava Rua da Liberdade.

Paralelamente, os ônibus expressos tiveram sua rota alterada para não passar mais pela rua Riachuelo e o governo arrumou as antigas calçadas, fazendo um belo canteiro de flores e lugares para sentar na frente do Paço.

Esta repórter foi conversar com os comerciantes locais para saber sua opinião sobre a revitalização  do Paço. Algumas pessoas lamentavam que o antigo museu já não se encontrava mais no local, mas mesmo assim sabiam que suas coleções tinham sido transferidas para outros locais. A maioria dos comerciantes e funcionários de lojas estava feliz com as mudanças. A retirada dos ônibus expressos deixou a região mais limpa e silenciosa. A arrumação das calçadas propiciou um trânsito mais seguro para pessoas de idade e cadeirantes. Além disso, ônibus de turismo passaram a estacionar próximos, para visitas à Catedral, ao Paço, para fazer compras e... para tomar um excelente café, com tortas e bolos de fina qualidade.

Como bem disse uma vendedora, antes só se podia comer lanches comuns, como pastel ou coxinha, nas lanchonetes da região. “É verdade que os lanches são mais caros no Paço, mas há coisas finas e diferentes que as pessoas apreciam comer de vez em quando”.

A concorrência do novo café também obrigou outros cafés da região a caprichar mais, e alguns chegaram a investir em novas louças, mobiliário, e a servir algumas coisas para comer, como bolo ou pão de queijo, mantendo os preços populares. No entanto, eles também se mostravam satisfeitos com o aumento da clientela, pois, mesmo com o novo café do Paço, aumentou o número de pessoas circulando pela região.

Até mesmo a loja mais antiga de  Curitiba, a tradicional Casa Edith, que fica na esquina da Praça Generoso Marques com a rua Riachuelo e vende chapéus, camisas, pijamas e artigos para homens, teve um aumento de vendas, aproveitando também que os chapéus panamá voltaram à moda. 

A iluminação renovada, utilizando um novo sistema de luminárias que iluminam mais as calçadas, também trouxe mais segurança para o local.


De um modo geral, pode-se dizer que, através das parcerias com o Sesc-Fecomércio e com ações governamentais muito bem pensadas, um lugar que estava com más condições de uso voltou a ser um ponto turístico e local agradável para compras e lazer. A reação popular com a restauração do edifício mostrou como a população trazia memórias afetivas de um local que sempre foi apreciado por sua beleza e como ponto de encontro. “Não basta apenas pintar o meio-fio”, como me disse um senhor de idade, mas foi preciso uma série de ações inteligentes e integradas para recuperar essa região.

Exemplo que merece ser copiado!

Claudia Lopes Borio é advogada ambientalista.

Imagens
Paço durante o dia: Humberto Mezzadri
Paço à noite:  Thadeu Peronne

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

HELLO, DOLLY! AS FÉRIAS E A LAGARTIXA

Dorotthy Coutinho


A mulher sonhava em fazer um cruzeiro num transatlântico de luxo, com direito as noites de luar no Caribe, drinques coloridos à beira da piscina, lugares exóticos com nomes românticos: Galápagos, Barbados, etc.
- Praia! – gritou a filha.
- Serra! – gritou o filho.
- Quintal! Sugeriu o pai, pensando na “grana preta” que ia gastar.

Praia e serra, uma semana em cada uma, esse foi o acordo. O cruzeiro no Caribe ficou aguardando a improvável circunstância do pai morrer e a mãe se casar com um ricaço. Tinham ouvido falar de um hotel novo numa praia ainda não desenvolvida, com preços promocionais, numa distância razoável, calculada as probabilidades de irem e voltarem no carro ano 90 da família, sem nenhum problema mecânico no meio do caminho.

Para a praia, portanto. Uma semana!
Tudo no carro: pomada contra queimadura, repelente, quinino, tabletes de sal, ataduras, antibióticos, lança-chamas contra um possível ataque de formigas gigantes, e o computador portátil para manterem contato com a civilização. Mas estava faltando algo importante para o papai: os cinco livros de Agatha Christie que segundo ele, o manteriam longe do sol, da areia e da água fria por toda a semana.

Foram dormir e lá pelas tantas da madrugada o pai foi acordado com algo macio e morno passeando na sola do seu pé direito – que sempre ficava descoberto - quando se deparou com uma lagartixa, hóspede permanente daquele hotel fugindo em disparada.

No dia seguinte na hora do almoço no restaurante do hotel:
- Eu pedi peixe.
- O senhor pediu peixe.
- Exato. E isto não é peixe.
- É sim senhor.
- Não, meu amigo. Isto é carne. – É peixe. – É carne. – É.
- Pode ser peixe-boi.
- O senhor quer trocar de prato?
- Não, não. Isto está ótimo. Bife com molho de camarão. A gente deve experimentar tudo na vida.

Coisa fascinante é o ciclo da vida que se manifesta durante as férias. Os mosquitos nos comem, as lagartixas comem os mosquitos, e mais cedo ou tarde servirão a lagartixa no restaurante do hotel, sem sal. O ciclo se completa e a vida segue o seu curso.
No dia da volta estava tudo no carro: a prancha, as conchas, tudo. Inclusive a lagartixa.