Por Jorge Carrano
A primeira aparição do jazz no cinema sonoro, inclusive no título do filme, realizado em 1927, foi uma fraude. Falo de “O Cantor de Jazz” (“The Jazz Singer”, no original).
Todo mundo, ou quase todo mundo, mesmo não sendo nascido na época, o que é meu caso (sou velho mas nem tanto), já assistiu à cena do Al Jolson (assim mesmo) cantando a indefectível “Mammy”, seja em documentários sobre cinema, seja em vinhetas e chamadas, pelo menos.
Foi um oportunismo, para aproveitar o sucesso do cantor na época. Pintaram-no de negro, pois negros autênticos não eram bem-vindos aos estúdios.
De jazz, nem o Al Jolson e nem o filme ofereceram coisa alguma, foi um embuste.
Os negros continuaram não sendo aceitos nos estúdios e nem nos seletos clubes, ainda por um bom tempo.
Alguns negros, entretanto, faziam sucesso no mundo artístico e o cinema, oportunisticamente, abriu-lhes as portas. Mas o fez de maneira equivocada, criando personagens bizarros.
Quem não se lembra de Louis Armstrong de turbante e pele de tigre, como um primitivo? Ou de Nat King Cole, em “Lamento Negro” (“Saint Louis Blues”), tocando aquele banjo e cantando uma música enjoadinha?
A meu juízo, o cinema só passou a dar tratamento digno ao jazz num passado mais recente, com o lançamento de dois bons filmes, no intervalo de dois anos. São “Por Volta da Meia-Noite (“Round Midnight”, de 1986) e “Bird”, de 1988, exibido no Brasil com o mesmo título original.
Alguém poderá dizer que um ano antes do “Round Midnigth”, foi realizado “Cotton Club”, em 1985. Acontece que a história principal, que aparece em primeiro plano, é policial. O mundo dos jazzistas é só tempero, é uma história paralela, secundária. Ou não?
Se você discorda, tudo bem, mas como o espaço aqui é meu, fica por isso mesmo.
Dizia eu que tanto “Round Midnigth” quanto “Bird”, foram realizados com muito respeito e, no caso deste último, com enorme sensibilidade pelo Clint Eastwood, que para quem não sabe é um jazzófilo top de linha, bom pianista e compositor.
O “Round Midnigth”, dirigido por Bertrand Tavernier, um francês que também é do ramo, nos permite apreciar a arte de Dexter Gordon e Herbie Hancock, entre outros, que estão lá presentes.
Aí sabe o que aconteceu em face do merecido sucesso dos citados filmes “Bird” e Round...” ?
Em 1990, o polêmico Spike Lee, depois de afirmar em entrevistas e prévias que branco não sabe fazer filme de jazz, resolveu filmar o ”Mo’ Better Blues” (no Brasil, “Mais e Melhores Blues”).
Espero que vocês concordem que Spike foi desrespeitoso com o Clint Eastwood, diria mais, extremamente injusto, pois o ex-Dirt Harry, fez um belo filme, contando a história do Charlie Parker (o bird do filme, era seu apelido). Charlie (o do “be-bop”)* foi interpretado pelo ator Forest Whitaker, num desempenho fantástico, só comparável, provavelmente, ao do Jamie Foxx fazendo Ray Charles, no bom filme “Ray”.
Voltando ao Spike Lee e a falta de respeito e injustiça cometidos contra o Clint, ousaria afirmar que “Bird” é infinitamente superior ao “Mo’ Better Blues”. Não sou expert em cinema, como não sou de jazz, mas acho que o Clint realizou um belíssimo filme, com uma trilha sonora de arrepiar. Uma aula, até mesmo para o Spike, um sujeito que não consegue segurar a língua e diz muita bobagem. Já se arvorou em crítico também do Woody Allen, dizendo que seus filmes não são interessantes por não terem atores negros. A propósito, o Woody Allen é um bom clarinetista, fanático por jazz e gravou um álbum, intitulado "Wild man blues" (não tenho).
E o Spike? Vai ser ativista chato assim lá em New York. Acho que ele faz do racismo seu meio de vida, sua profissão de fé.
E conhece ou demonstra conhecer menos de jazz do que Clint, e até mesmo do francês Bertrand. Aliás que os franceses amam de paixão o jazz. São constantes os festivais realizados em pequenas cidades, sendo um dos mais importantes o de Juan-les-Pins na Côte d'Azur, situada entre Nice e Cannes.
Não estive lá, mas se você tem euros na gaveta, deve ir. Tenho fita VHS com trechos de algumas edições deste tão antigo quanto badalado festival, que gravei quando exibidos pela TV cultura de São Paulo há alguns anos. Estiveram lá: Louis Armstrong, em 1967; Count Basie, em 1960, Kid Ory and Creole Jazz Band, em 1959, entre outros. Bons tempos, hein?! Mas o festival sobrevive.
Não é nada , não é nada, dei 4 dicas de filmes: “Bird”, “Round Midnigth”, ‘Mo’ Btter Blues” e “Cotton Club”. Sem falar no “Ray”, um belo filmebiografia de Ray Charles, que transitou pelo jazz, blues, soul e afins.
Para os (muitos) amantes de Billie Holiday, sugiro o filme “O ocaso de uma estrela (“Lady Sings the Blues”, no qual a diva é interpretada pela Diana Ross.
E para os apreciadores de filme romântico/musical, indico “High Socety”, no qual aparecem e cantam inclusive um pouco de jazz, Bing Crosby, Frank Sinatra e Louis Armstrong. Tem, ainda, a beleza da Grace Kelly.
E se o gosto do nobre leitor aceita musical mais clássico, assista “Hello, Dolly!”. Porque, entre outras coisas, o Louis Armstrong interpreta um líder de banda (papel dificílimo pra ele, rsrsrs) e canta a música título.
* Falarei deste movimento num próximo post.