Comecei a me entusiasmar pela escrita na escola, quando
minhas redações começaram a fazer sucesso.
Eu era uma garotinha tímida e vesga, e as crianças não perdoam
esses predicados. Fiquei cada vez mais tímida, tinha medo de abrir a boca, e
meu ideal naquele tempo era ficar invisível. Mas um dia, lá pela segunda série,
alguém elogiou uma redação feita por mim. Vi olhares meio admirados em minha
direção. Ninguém podia esperar que aquela figua apagada com cara de boba conseguisse essa façanha.
Meu ego de oito anos se libertou do esconderijo e deu umas
cambalhotas pela sala.
Claro que eu não tinha a noção clara do que estava
acontecendo, mas foi uma sensação tão gostosa que nunca mais esqueci. A certeza
de que alguma coisa minha podia ser admirada pelos outros foi a primeira chance
de me sentir gente entre as gentes. Pouco tempo depois fiz os primeiros amigos
na turma e parei de inventar motivos pra faltar à escola.
Todo mundo precisa de alguma coisa que o faça sentir-se "como os outros". Nem precisa ser algo importante ou notável, mas a sensação de igualdade, de aceitação, desde a infância é essencial na vida. Isso é tudo que um ser humano precisa para abrir caminho à felicidade. Por isso, a partir desse tempo, escrever passou a ser um hábito. Era o
meu forte, o que me dava um motivo suficiente para justificar minha existência.
Mais tarde incorporei também a leitura, o desenho e a pintura às coisas
boas da vida. Enquanto isso tudo acontecia, outras alegrias foram crescendo e aparecendo: amigos, pessoas afetivamente importantes,
acontecimentos reconfortantes que iam tornando a vida muito mais gostosa de viver.
A timidez continuou, embora nunca tenha propriamente impedido meu movimento entre os outros. A leitura, a escrita e a pintura prosseguiram sendo atividades um pouco
compulsivas, que sempre trazem bem-estar.
Não corri atrás de profissionalização, embora meu trabalho tenha sido quase sempre com textos e desenho. Mas posso dizer que escrever foi uma libertação e
continua, décadas depois, a representar uma gratificação que não dá pra
dispensar. Hoje fico pensando se não deveria ter procurado caminhos mais condizentes com essas atividades. Só que agora ficou meio tarde pra essa pretensão. Então, viva os blogs, por onde a gente pode se manifestar livremente, e que têm trazido alguns retornos, se não vantajosos do ponto de vista financeiro, que ficou sempre em outros departamentos, ao menos compensadores do ponto de vista do ego, que continua bem contentinho desde os oito anos.
Imagem Journey, de Slawek Gruca.