sexta-feira, 28 de outubro de 2011

VIDAS IMAGINADAS


Por Lilian Zaremba             


Monteverdi : “Altri Canti d’Amor”, madrigal do oitavo livro


Claudio Monteverdi (1567-1643) - Volgendo il ciel (1/2)The Consort of Musicke
Anthony Rooley

Paul Agnew, tenore solo
Emma Kirkby, Suzie LeBlanc, soprani
Mary Nichols, contralto
Alan Ewing, basso


Se alguém descrevesse sua vida...
se alguém escrevesse sobre como você viveu...
Seria possível que fosse verdade?
Até que ponto alguém pode descrever a vida que você viveu?      
Giorgio Vasari fez isso, escrevendo a biografia “Vidas Artistas”... e passou à História. Marcel Schowb escreveu “Vidas Imaginárias” e também passou à História... realidade ou ficção? em qual biógrafo você depositaria o relato de sua vida?

a História

Giorgio Vasari, nasceu em  Arezzo, 1511, Toscana.
                       Ainda garoto foi estudar em Florença com Miguelangelo, que mais tarde se tornaria seu amigo.  Depois, quando seu patrão Duque Alessandro foi assassinado, Vasari passou a vagar pela Itália com seu caderno de desenhos na mão.Foi nesta época que teriapensado em escrever sobre a vida e obra dos artistas.
                        Aos trinta anos Vasari era, ele próprio, um pintor de sucesso embora sem patronagem... e isso, em plena era do mecenato como forma de sobrevivência artística era realmente um impasse...
                        Em 1550 publica a primeira versão de seu livro “Vidas de Artistas” que é recebido com entusiasmo. Dedica este livro a Cosimo I de Médici, um possível futuro mecenas... por isso retorna a Florença conseguindo afinal servir ao Duque de Médici.

               Fatos e sua invenção

                        Miguelangelo nunca quis pintar a Capela Sistina, e fez tudo o que pôde para evitar este trabalho.
Concluiu que pintar era a forma que seus rivais encontravam para banir seu trabalho de escultor para longe das atenções... e pensava que o forte de sua arte eram as esculturas...
                        Por isso decidiu pintar a Capela Sistina sem que ninguém pudesse acompanhar o processo de pintura...mas outro artista, Raphael, foi esperto, bisbilhotou conseguindo ver o bastante para, imediatamente, mudar o rumo de seu próprio estilo!
                        Este é um exemplo de histórias sobre a arte italiana que Vasari registrou em seu livro “Vida de Artistas”,  livro considerado a pedra inaugural no conceito de “rinascita”, ou seja, Renascimento.
                        Segundo a historiadora,  Elisa Byington curadora de importante exposição sobre este “teórico“italiano que agora abre na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro“devemos a Vasari todos os conceitos que explicam o que foi o Renascimento”.

Vidas Imaginadas

Vasari escreveu sobre a realidade cotidiana e profissional de artistas...mas será possível escrever sobre a vida de alguém? Marcel Schowb disse:“...a ciência histórica nos leva à incertezas quando se trata de indivíduos. Não faz mais do que revelar alguns momentos, editados de ações gerais...”

                        Para Marcel Schowb, um escritor simbolista do século 19, todos os feitos individuais valem unicamente por terem modificado algum acontecimento ou uma série deles. Eis a medida da Ciência mas, como lembrou, a Arte se encontra no lado oposto das idéias gerais...nunca classifica...geralmente...desclassifica. Sendo assim Schowb em seu livro “Vidas Imaginárias descreve outro plano desta que poderia ter sido a vida de Paolo Ucello...

                        “Na realidade se chamava Paolo di Dono, mas os florentinos o chamavam de Ucello ou também “Paulo Pássaros” por causa da grande quantidade de pássaros e animais pintados nas paredes de sua casa”...
                        “era tão pobre que não podia manter animais ou mesmo conhecer os que nunca vira... o problema é que ao pintar um afresco sob encomenda em uma capela de Pádua, acabou desenhando a imagem de um camaleão que ele inventou: parecia um camelo barrigudo e boquiaberto!
“a verdade é que para Ucello pouco importava a realidade das coisas, preferindo sua multiplicidade e infinito das linhas...”
                        “pintou campos azuis, cidades roxas, cavaleiros com armaduras negras em cavalos de ébano que soltavam fogo pela boca...“...Paolo Ucello viveu como um alquimista...perto dele viviam Donatello, Brunelleschi, dela Robbia... cada um com mais orgulho de sua arte e zombando de Ucello que a cada nova combinação de linhas esperava ter encontrado nova maneira de criar...”
“...não era sua finalidade imitar, copiar um modelo...Ucello buscava desenvolver algo novo...

Esta teria sido a vida de Paolo Ucello?
Fato real ou imaginário?

entre o real e imaginário

Paolo Ucello existiu: viveu em Florença entre 1397 e 1475 sendo pintor e matemático. Segundo Vasari escreveu em seu livro, Ucello era tão obcecado por perspectiva que era capaz de passar noites acordado até encontrar o ponto exato de finitude de uma linha.
                        Ucello, usava a perspectiva para criar o sentimento de profundidade em suas pinturas.
Para Giorgio Vasari,  o talento de Ucello, embora imaginativo era excêntrico, encontrando prazer em dificuldades, isto é, desvendar impasses, frequentemente abandonando um talento fértil e espontâneo em algo estéril... aonde Vasari viu desperdício, Schwob viu uma mente efervescente... quem teria a melhor descrição da vida deste artista?      As descrições são complementares: a biografia escrita por Vasari possui inquestionável importância para os estudos da arte do Renascimento...
e as pequenas biografias imaginárias escritas por Marcel Schwob nos lembram que a realidade sempre anda junto com a ficção...


sugestão de leitura :

Vidas Imaginárias – Marcel Schowb (prefácio de Jorge Luis Borges).
Vidas de Artistas  - Giorgio Vasari



Mostra da Fundação Biblioteca Nacional celebra os cinco séculos do pintor, arquiteto e historiador italiano Giorgio Vasari


Início hoje, sexta feira, 28 de outubro de 2011. Entrada Grátis








Gravura de Giovanni Cavalleris, de 1571: reprodução do afresco de Rafael A Batalha de Constantino contra Maxêncio, do Museu do Vaticano

Natural de Arezzo, Giorgio Vasari (1511-1574) conjugava as habilidades de arquiteto e pintor ao projetar imponentes edificações e decorar os interiores com afrescos. Seus legados mais notáveis são a Galeria Uffizi e o Palazzo Vecchio, ambos em Florença. Ganhou notoriedade também como crítico e por ser o primeiro historiador da arte de que se tem notícia. Foi ele quem lançou, em 1550, o pioneiro livro do gênero, As Vidas dos Mais Conhecidos Pintores, Escultores e Arquitetos — De Cimabue até Nossos Dias. Era um catálogo com biografias de artistas que atuaram nos séculos anteriores, como Giovanni Cimabue (1240-1303) e Giotto di Bondone (1266-1337), e também de Michelangelo (1475-1564) e Rafael Sanzio (1483-1520). Muitos atribuem a ele a conceituação desse período como “Rinascita”, o que lhe valeu o título de Pai do Renascimento. Um pouco dessa rica trajetória e produção poderá ser conhecido por meio dos 200 desenhos, gravuras e livros raros integrantes da mostra Giorgio Vasari: a Invenção do Artista Moderno.
As peças foram pinçadas do acervo da Real Biblioteca de Portugal, trazido ao Rio em 1810 a mando de dom João VI e conservado na Biblioteca Nacional. Curadora da atração, a historiadora Elisa Byington destaca entre os itens expostos um exemplar original da segunda edição do livro Le Vite de’ Più Eccellenti Pittori, Scultori e Architetti, de 1568. Haverá também um setor com gravuras de Michelangelo e de Rafael, além de obras de artistas da geração seguinte por eles influenciados. Entre eles está Giovanni Battista Cavalleris (1525-1597), autor da gravura A Batalha de Constantino contra Maxêncio, com 1,68 metro de comprimento. Datada de 1571, a peça reproduz o afresco homônimo de Rafael, que fica no Museu do Vaticano.
Giorgio Vasari: a Invenção do Artista Moderno. Fundação Biblioteca Nacional — Espaço Eliseu Visconti. Rua México, s/nº, Centro, 3095-3862. ↕ Cinelândia. Terça a sexta, 10h às 18h; sábado, domingo e feriados, 12h às 17h. Grátis. Até 4 de dezembro. A partir de sexta (21). Fundação Biblioteca Nacional/