Lais Niman da Silva |
É irônico ser Lais, de 23 anos, que se forma em Direito este ano na Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e mora em Sete Lagoas (MG) com o irmão.
Eis a Senhora do Tempo de hoje.
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Memórias de Caxambu, vida no interior...
Por Lais Niman da Silva
O privilégio de viver no interior é que nossa pequenez fica integralmente relativizada. Não somos apenas mais um, mais um que passa em uma cancela qualquer, sabe-se lá onde; mais um que faz aniversário ou que é atropelado no vigésimo quinto cruzamento de uma via expressa...
Por que? Talvez porque sobre mais tempo para desviarmos nosso olhar, ou por não sermos escravos de nada, nem de trabalho, nem de trânsito, nem de mercado, nem de marginais, nem de horário. Aqui, a nossa independência tem um toque lúdico, não é matemática, tampouco estatística.
Temos nosso nome, sobrenome, família, amigos e até “aquela” cadeira marcada “naquele” café. A árvore genealógica de cada um parece ser de inteiro conhecimento da população, assim como, o que não se pode deixar de falar, cada passo do passado, presente e, por que não, do futuro. Diria que é um campo mais fértil para a confiança germinar, aquela confiança do fio do bigode que, onde ainda existe, foi substituída por algum documento assinado e autenticado em cartório.
Caxambu tem gosto de biju (não era pra rimar), de água mineral, de café da tarde, de colo, de família, de gargalhadas, de ballet. Crescer respirando o ar puro do “paraíso das águas”, ao som de piano e doces vozes a nos guiar, não é coisa que se possa desprezar, até porque reflete em cada etapa da nossa existência.
Dar comida aos patinhos do lago, andar de charrete sob a brisa fresca da manhã, caminhar por trilhas tão cheias de paz, conquistar nosso espaço em um ambiente tranquilo, conhecer tradições, orações, animais, aproveitar o nosso “vale florido de amor”, criar laços...
Há, os laços!
Como são importantes em nossas vidas. Tudo isso constrói nossa essência, delimita nossos valores que, acreditem, serão muito bem testados ao longo do tempo. É bom sentir cada momento vivido por nós, saber de onde vimos, porque somos assim ou assado pois é aí que saberemos para onde vamos. Não ser um mero expectador em nosso próprio palco e não deixar o tempo nos fazer esquecer nossas motivações e ideais é coisa rara hoje em dia.
Fácil é cair em uma grande massa, manobrada por poucos (bem ordinários): é neste ponto que nos rendemos a uma pequenez mesquinha e perdemos nossa identidade...
Em um lugar, que não sei ao certo se ainda é do passado, chamado Ouro Preto, encontrei boas doses de magia arraigada em cada mínimo pedaço da cidade. Pedras e madeiras parecem nos contar longas histórias onde mito e realidade se misturam, porém, cidade interiorana que é, não deixa de ter aquelas características típicas que permitem o domínio do tempo e de nós mesmos.
O passado exposto em arte, páginas amareladas em museus, igrejas que exalam fé e mistérios e monumentos que demonstram atos de bravura compõem um extenso romance que nos coloca em uma oscilação de nostalgia e compreensão de nossas origens.
A paisagem construída em ouro e sangue sobre montanhas negras e, quase sempre, nebulosas, transporta seus personagens para uma frequência intensa de alegrias, prazeres, belezas, amores, ódios, dores, medos, encantos, delícias, insanidades, santidades, milagres, euforias, alforrias...
Para carregar tanta energia, é preciso estar sempre com os ombros descansados! Embora bem pesado esse fardo, é única e inesquecível a (con)vivência nesse lugar. Superar limites, enfrentar fraquezas, decepcionar-se, surpreender-se, tomar chuva, suar ao sol, subir e descer morros, abusar da folia, criar intimidade com a cultura, inventar paixões, cheirar mofo, compartilhar momentos, amadurecer, chorar, sorrir, descobrir infinitos horizontes... São constantes da vida ouropretana, inferno e paraíso: bagagem suficiente para querer sempre mais!
A Dama do Lago- Imagem da Ninfa (Parque das Águas de Caxambu) |