quinta-feira, 17 de março de 2011

CORRESPONDÊNCIA URBANA. CHILE

Cara amiga Regina Branco,

Como está indo a sua viagem para Santiago e para a Ilha de Páscoa? O que você está achando da organização urbana e cultural da cidade de Santiago?

Beijos,
Esther


Então, amiga, não consegui ir para a Ilha de Páscoa. Fui informada que precisava fazer reserva com seis meses de antecedência. Como já conhecia Santiago, resolvi aprofundar esse conhecimento caminhando pelas ruas e seus museus.

Entrei no Museu Nacional Benjamin Vicuña Mackenna onde encontrei a história da cidade. Era uma cidade comum, suja, cheia de mendigos, ladrões, traficantes, isso no início de mil oitocentos e pouco, não guardo bem as datas. Muito bem, amiga, esse homem cujo hoje tem o museu o nome dele fez uma viagem a Paris com a mulher dele; e encantou-se por Paris. E pensou o seguinte: vou fazer de Santiago a mais bela cidade das Américas.

Encomendou a um arquiteto francês fazer um plano urbanístico para a cidade. Levou o arquiteto para a cidade e mostrou a tristeza que era a cidade... então, em cinco ano, o senhor Benjamim conseguiu transformar a cidade em algo lindíssimo, com prédios maravilhosos.

O Teatro Municipal de Santiago é semelhante L’Opera de Paris, assim como o nosso no Rio de Janeiro, as ruas são imensas e largas avenidas, todas arborizadas, com plátanos, algumas outras calles são arborizadas com pinheiros... a cidade inteira é repleta de jardins... as calçadas são muito largas e as ruas tem três ou quatro mãos para veículos. Então, resultado, não há trânsito empacado na cidade. Nada fica congestionado, o trânsito flui. Aliás, tudo flui lá.

Há escolas para todos os lados. Uma coisa que Bejamin se propôs a fazer foram as muitas escolas, então em cada esquina e quarteirão, você tem de uma a duas faculdades.

É impressionante, nunca vi em minha vida uma cidade com tantas universidades como Santiago.

Na rua, você pode olhar para o chão e não encontrará uma binga de cigarro, nem um pauzinho de fósforo, nem um pedacinho de papel.

As pessoas atravessam na faixa quando o sinal está aberto para elas. Durante esse tempo todo em que estive lá – cerca de quinze dias – eu não li em nenhum periódico que houvesse tido um assalto, um roubo, um assassinato... não existe isso. Nem em Santiago nem nas cidades vizinhas, de interior. Então eu não vi nos jornais nenhuma notícia de crime e violência, que se tornou lugar-comum no Brasil.

Buracos na rua? Isso não existe lá.

Outra coisa que me chamou atenção: eles tiram nota de tudo o que vendem, você não precisa pedir. Acredito que haja uma boa arrecadação fiscal porque não houve um único local em que eu comprasse qualquer coisinha que não me dessem a nota fiscal. E o troco certo em tudo, ao invés das famosas balinhas que costumamos receber no Brasil no lugar do troco.

Chofer, motorista, se você entregar o dinheiro inteiro, eles te dão o troco corretamente. Em qualquer restaurante, idem. Eu fiquei tão impressionada com a capacidade desse homem, o Benjamin Mackenna... Tinha um morro onde ficavam todos os ladrões, marginais; ele derrubou todos os barracos e fez caminhos lindos, botou jardins, jardins, jardins... e uma igreja maravilhosa.

Moral da história: em cada quarteirão você encontra jardins imensos, colados, locais para a garotada andar de skate, de bicicleta.

Olha, amiga, de todas as minhas viagens pelo mundo, não lembro de ter visto uma cidade tão limpa e tão bonita. Garanto que pelo menos aqui na América não tem.

Santiago seria a segunda cidade mais bonita que vi na minha vida. A primeira é Washington – indubitavelmente Washington é a cidade mais limpa e mais bonita que já vi na minha vida... porque eles pegaram a Grécia e levaram para lá.

Então todos os edifícios têm colunas imensas, tem lagos, jardins enormes... e você pode depois do trabalho deitar nos jardins... ou tirar uma soneca ou comer o seu sanduíche... quando chega de noite vem aqueles caminhões imensos, retiram as placas de gramas que estão amareladas e colocam outras novas, de modo que você nunca vê uma grama amarela nos tantos jardins de Washington.

A água do rio de Washington é tão limpa que você pode bebê-la. E voltando para o Chile, as águas de lá são maravilhosas porque não têm gosto de cloro. Como eles fazem a purificação, eu não sei, mas é uma água saborosa. Eu lavo o meu cabelo e não tem aquele cheiro de cloro, nem o bafo.

No Chile, encontrei um povo civilizado que diz “dá licença”. Por exemplo, nos metrôs não há bancos especiais para idosos, nem para grávidas ou deficientes, porque as pessoas levantam para dar lugar tão logo alguém nessas condições entre no vagão.

Portanto, este é um povo educado, que tem faculdades em todos os cantos, museus maravilhosos, Centro de Arte Gabriela Mistral é fenomenal, lindíssimo – com bibliotecas, com amplos espaços onde pessoas vão lá dar seus depoimentos. Tem uma praça onde os jovens vão fazer os seus discursos, tocar música e descansar. Então eu saí de Santiago apaixonada por Benjamin Mackenna, que em cinco anos fez um plano urbanístico e o executou na cidade.

Quando eu cheguei ao Rio e fui ao IBGE, andei pela cidade e vi todo o contraste entre um cidade e outra: poças de água imundas nas calçadas, ruas esburacadas, papel sujo no chão, mendigos nas esquinas, enquanto não vi um único em Santiago – o que eu suponho que eles devam dar muito apoio à população mais humilde.

Contraste brutal. Que pena eu tenho do meu Brasil.

Beijos,
Regina