A SECRETÁRIA SEM LEMBRANÇA DO PASQUIM
Querida Dorothy,
Noutro dia, o Jorge Carrano lembrou de "O Pasquim", não sei se num texto dele sobre jazz ou se em algum comentário. Falei então que você havia trabalhado lá como secretária; menos famosa do que dona Nelma. No entanto, seu senso de humor é invejável e pontual. Pelo que me lembro dona Nelma era somente a personagem oculta dos humoristas de plantão.
Amiga, sei que anda atrapalhada com papos atrasados nas praças de São Lourenço, onde mora atualmente, porque a cerveja daí é, certamente, a melhor. Tenho dúvidas quanto a isto, Dorothy, mesmo não podendo fazer uso de bebida alcoólica. Mas como morei aí, sei dos encantos da cidade.
Tenho um pedido: poderia relembrar, num artigo, seu tempo no Pasquim?
Beijo,
Esther
OU VIDA DE APOSENTADA EM CIDADE DO INTERIOR
São Lourenço. Foto de Esther Lucio Bittencourt, em Olhares. |
Por Dorothy Coutinho
A secretária menos famosa do antigo Pasquim.
Conviveu até com dona Nelma,
a que ganhou nome nas páginas do tablóide.
Olá amigas!
Estou atarefada cuidando do que resta da chamada saúde plena. Vivo a famosa PVC – a porra da velhice que chegou.
Chegou trazendo um achatamento não sei das contas numa parte da coluna vertebral. Dói prá cacete. É o inexorável. Os paliativos vão desde os antiinflamatórios até as caminhadas que já faço independente do conselho da médica.
Na sola do pé esquerdo nasceram dois lindos calos, com belos nomes “olho de peixe”. Imaginem, e eu que adoro peixe!
No outro extremo, quer dizer na boca, recebi o diagnóstico de “perda total” mais de 4 dentes da arcada inferior, que estou extraindo para a prótese parcial. Por enquanto faço o famoso “sorriso 1001”.
Comprei um leque para poder sorrir na rua. Dá prá imaginar aquele olhar 43 de uma gueixa? Estou com uma extração recente ainda com os pontos, que deverão ser retirados na próxima segunda-feira. Um desconforto a mais...
O sacana do cirurgião dentista propôs o implante. Fiquei toda assanhada com a idéia, até saber o preço unitário para cada implante: em torno de 1.800 contos.
Diante a quantidade de dentes perdidos será mais interessante, mesmo banguela, investir essa grana num cruzeiro internacional num desses belíssimos transatlânticos que visitam o Brasil no verão, né não?
Posso viajar no anonimato, negando a minha idade, já que não comemoro mais aniversário “para não banalizar a data”, assim como minha amiga, que nega de pé junto que ela e o Ruy Barbosa “ficaram”, eu também ficarei a vontade para negar que paquerei o Getúlio, mas o perdi para a Virgínia Lane.
O papo sobre os inusitados que aparecem no nosso corpo rolou na praça, no meio da semana, quando uma coroa chegou ao grupo tendo sobre a cabeça um chapéu tipo “sombrero” prá proteger os pequenos curativos e marcas de recente cirurgia.
Seu rosto parecia um canteiro de obras.
A mais endinheirada, tipo assim www.maridorico.com, nos disse já ter agendado uma lipo, botox na bunda, um mega hair, silicone no peito e clareamento dos dentes. Ah, sempre os dentes. E tudo isso antes do carnaval, imaginem.
E eu, com todas as urucubacas da 3ª.dentição, sem grana para fazer um recall, vou me contentando com os sutiãs com estampas de bichinhos, tamanho PP (pouco peito), daqueles que não levantam nem pensamento e com a mesma cara e a mesma bunda com milhares de furinhos amigos do ano passado.
Como vocês podem ver continuo tagarela, ainda que por e-mail.
Com respeito ao texto da experiência Pasquim, posso assegurar que a minha memória da linha do tempo não arquiva detalhes. Não me lembro sequer de um pé gelado me cutucando. Meus neurônios devem estar virando meleca. Portanto fica difícil construir um texto sobre um determinado período, sem os pequenos detalhes que enriquecem qualquer texto biográfico.
Beijocas,
Dorothy, Ana Nívea e Farofa (velhinho e fedorento)......
Para recordar o filme que dá título a esta coluna, Barbra Streisand e Louis Armstrong interpretam Hello Dolly, de 1969. seja bem vinda Dolly/Dorothy.