ANA LAURA DINIZ CONVERSA COM BIANCA SABINA OLMEDO MONTEIRO FERREIRA
Bianca por ela mesma: “Blogueira, indecisa, tímida, crítica, aspirante a fotógrafa, etc, etc.” Nascida em Varginha (MG), a estudante de 15 anos é a mais nova colaboradora do Primeira Fonte. O tema que desenvolverá? Adolescência. Nada mais propício do que uma conversa sobre o tema.
Bianquinha de Ouro,
Tudo bem?
As pessoas são sempre complexas, mas na adolescência determinadas situações parecem tomar proporções gigantescas. Ao menos, quase vinte anos depois, é do que me lembro.
Recordo-me de uma vez a minha irmã mais velha, Ana Beatriz, já com seus 22 anos ter dito: “Fica tranquila, daqui a pouco você sentirá a vida mais segura; muita coisa se transforma quando se chega aos 20.” Eu acreditei, mas ao menos para mim, tive que esperar mais tempo: chegar aos 30 é que foi revolucionário – experimentei então a inigualável segurança e desejo de liberdade.
A maturidade, imagino, ajuda e muito nesse processo.
Mas eis que você tem 15 anos, e quero saber qual a sua impressão da adolescência. A sua forma de ser e viver vai de encontro com o estilo de vida dos seus amigos? Você se sente sozinha de vez em quando? Se sim, o que faz nessas horas?
Se pudesse ter total domínio da sua vida, o que desejaria?
O que mais a irrita e agrada?
Qual a relevância da sua família para a sua formação como pessoa? Você tem diálogo aberto em casa?
E o amor, o que é? Você tem vergonha de assumir quando ama? Você fala "eu te amo"? Se sim, em que circunstâncias e para quem?
Como você espera estar daqui a cinco, dez anos? Em que lugar?
Amigos são importantes? Quais as características que uma pessoa deve ter para ser considerada para toda vida?
Você sente que os seus amigos a compreendem ou tem a sensação de sempre estar à margem das situações, de "falar grego"?
Quais assuntos você geralmente conversa com os amigos e quais sente que é proibida de abrir a boca?
O que é diversão? O que gosta de fazer, incluindo os momentos de folga?
Ficção ou realidade, o que prefere?
Se fosse possível fazer um raio-x dos pensamentos humanos, o que seria revelado de você hoje?
Se fosse possível, você gostaria de ter um raio-x desses para usar em que circunstâncias?
Como é a Bianca por ela mesma?
A sua palavra de ordem, pelo que percebo, é "superação". De onde veio essa crença?
São tantos questionamentos, que é claro, fique à vontade para responder o que e na ordem desejar. Adolescência estimula o raciocínio... eis a era da efervescência!
Beijos,
Ana Laura
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Oi, Ana,
Considero a adolescência uma fase complexa no geral, sim, porque é cheia de mudanças e descobertas, que nos faz achar que já sabemos tudo e que nos decepciona ao percebermos a cada momento que não é assim. Há muito a ser vivido ainda. E imagino que nem façamos ideia de como seja o futuro, só falamos aquilo que observamos nos adultos.
O modo de encarar a vida depende da situação. A vida é cheia de altos e baixos, então, a visão muda de acordo com o humor e a disposição de ver e enxergar (como você diz, Ana), na hora. Principalmente agora, que estou na fase de mudar constantemente… Considerando a grande parte que valeu a pena, posso dizer que até agora foi bom.
Talvez seja errado criar expectativas, mas, na verdade, espero que com o tempo fique ainda melhor. Porque meu modo de ver as coisas foi o que mais mudou, e quanto mais me sinto sensata (e entendo que no fundo, posso até não ser grande conhecedora mas sou uma grande apreciadora, de fato), percebo que toda a minha visão de mundo se tornou mais esperançosa, ampla, um pouco menos pessimista, mas sem idealizar demais fugindo da realidade, claro. E assim, a vida parece mais fácil. Não foi conformismo, não. É só uma percepção melhor mesmo. Acho que a maturidade é isso.
Apesar de um dos meus maiores bordões ser “ô vida tirana!”, tenho tentado enxergar a vida como algo positivo, já que o tempo é curto e devemos desfrutar de cada segundo, sem deixar que as oportunidades passem (todos dizemos isso, mas na prática, não é possível sempre. Mesmo assim, vivemos tentando).
Passo a maior parte do meu tempo na frente do computador escrevendo, se não estou na escola. Parece um pouco contraditório em relação ao que disse antes, mas, sinceramente, é uma escolha. Aqui expresso as opiniões que pessoalmente ninguém costuma perguntar. As deixo acessíveis pra quem se interessar em ver. E acho que é exatamente essa a diferença do meu conceito de diversão pro dos meus amigos, ou outras pessoas da minha idade. Todos querem festas, bebedeiras, dançar e beijar todos o que estão disponíveis. Particularmente não gosto de festas, e as evito, mas quando meus amigos fazem alguma, vou, danço mesmo sem saber, e tento fazer valer a pena (mas apenas por estar com eles, já que nunca vou me sentir completamente confortável pelo tipo de música que costuma tocar). Não sou muito desses agitos. Aprecio mais a calma, às vezes o silêncio, a solidão da leitura, e quando com as pessoas, gosto de compartilhar ideias, conversar, conhecê-las como são.
Amo a fotografia, acho o melhor jeito existente de explorar o mundo que está fora do meu quarto e guardá-lo comigo. Guardar as pessoas, e os momentos também. Me divirto assim, com minhas pequenas coisas.
Me sinto sozinha de vez em quando, mas, até gosto disso num certo ponto. Gosto de me sentir independente pra poder fazer minhas próprias escolhas e atividades, sem depender da vontade alheia… Mas, claro, chega uma hora que cansa. Ter gente por perto é uma necessidade, ninguém é feliz sozinho. Nesse caso, entro no twitter, e lá vejo meus amigos reclamando por perder tempo nesse site (é incrível como sempre estão dizendo isso, sempre mesmo) e aceito seus convites para dar uma volta (já que não há muito o que fazer na cidade de Caxambu (MG), além das voltinhas intermináveis no quarteirão praça/calçadão). Vemos todos os outros fazendo o mesmo (ainda que no sentido contrário), colocamos o papo em dia, e isso é o suficiente.
Se eu pudesse ter total domínio da minha vida, gostaria de viajar o mundo, conhecer tudo. Na verdade, adoraria poder me teletransportar, já que nunca gostei de viajar por passar tempo demais dentro do carro, e isso me manter muito imersa em pensamentos.
Há coisas que não gosto de pensar, mas com um tempo longo demais, penso em tudo e no fim se torna inevitável deixá-las de lado. Enfim, minha vontade maior é essa. Conhecer o máximo que puder.
E se tem coisa que me irrita? Ah, a futilidade alheia!!! A falta de perspectiva, o desinteresse pelas coisas, e aquele comportamento de fazer tempestade em copo d’água das pessoas que não enxergam a pequenice dos seus problemas perto dos das outras. Insistir em assuntos que evito, músicas de artistas que não gosto, sensacionalismo… Na verdade, é muita coisa pra listar. Assim como as coisas que me agradam, também. Música, livros, risadas, demonstrações de afeto…
A relevância da minha família para a minha formação como pessoa é bem grande. Agradeço muito por ter nascido nesta família, num meio de pessoas cultas, com muito a acrescentar. Se estivesse em qualquer outra, provavelmente não seria metade da pessoa que sou, com os interesses e princípios que tenho. Mas, como nem tudo é vantagem… Não é exatamente algo bom, pois, como fui criada por avós, fui bastante mimada a vida toda, tive sempre tudo o que quis… E acho que hoje isso me prejudica em muitos sentidos, já que não sei lidar com desapontamentos, e eles de alguma forma são frequentes. Apesar de tudo, tenho muitas opiniões divergentes a eles, mas, acho que isso é parte da personalidade que adquirimos sozinhos.
Temos diálogo bastante aberto, eles sabem de absolutamente tudo o que acontece na escola e com meus amigos, e estão sempre rindo comigo a respeito.
Amor pra mim é uma mistura de respeito, confiança, admiração, companheirismo, carinho, e um pouco de afinidade. E claro, sensação de conforto perto da pessoa.
Não tenho vergonha de admitir quando amo, mesmo sendo tímida. Só quando realmente o sinto, e também, acabo demorando um certo tempo até achar adequado dizer, mas, sempre digo pras pessoas, pras coisas, acho que faz tão bem! Basicamente, digo pro que me agrada, pros meus amigos, quando pessoas se tornam especiais…
Como qualquer pessoa da minha idade, espero estar bem no futuro. Formada na faculdade, cursando outra (tenho uma porção de interesses completamente diferentes, então se possível, tentarei fazer mais de uma), morando num lugar só meu, cheia de amigos (como hoje), trabalhando com o que eu gosto (fotografia/arte), com meu carro (morro de medo e não pretendo aprender a dirigir, mas, acho que até lá mudo de ideia)… Tenho o sonho de morar fora do país, mas, como acho que realmente não vai ter jeito, quero morar no sul, a “Europa brasileira”. Se conseguir passar em Porto Alegre, perfeito, mas se não… Continuarei tentando!
Amigos são muito, MUITO importantes! Eu acho que a confiança e a compreensão são características essenciais. Sem isso, não há como existir afinidade ou carinho, entre outros derivados…
E depende muito do assunto, mas, na maior parte deles, realmente sinto que “falo grego”. Meus amigos e eu temos interesses, opiniões e gostos muito diferentes, e por um lado, acho que isso atrapalha em alguns momentos… Nunca vemos nada com o mesmo ponto de vista, ou tivemos as mesmas experiências para opinar. E é nessa parte que entra a compreensão. Com o tempo aprendemos a aceitar a personalidade uns dos outros, e isso torna as coisas mais fáceis, já que as discussões desaparecem.
Normalmente nos juntamos pra falar de nós mesmos, trocar experiências, contar novidades, e inevitavelmente, falamos dos outros também. Dos conhecidos, da galera da escola… Aí lembramos de coisas que já passaram, e rimos muito. Mas fora isso é pouca coisa, já que os gostos são diferentes. Um pouco de música, internet, seriados, filmes… Nada muito além. Evitamos assuntos mais complexos (porque sou do tipo que questiona e discorda de tudo), como religião, questões políticas e sociais, perspectivas e objetivos, entre outros que variam pra cada pessoa.
A gente sabe sobre “o que não falar” na presença de cada um, tentamos não ser aquele tipo de amigo inconveniente, porque provocações desnecessárias nem sempre acabam bem.
As amizades na adolescência parecem bem mais frágeis, e são volúveis. Qualquer coisa já é motivo pra brigar, pra sentir ciúme, achar que o amigo trocou por outro… É tudo muito complicado. A preguiça de resolver na hora é maior, então, o clima ruim prevalece por meses… Até que se resolva sozinho (ou não, depende).
Ficção ou realidade? – Na maior parte das vezes, prefiro a ficção. Não é que a realidade não me agrade, mas… Tento me desligar dela ao máximo possível. Sinto que me concentro mais com meus livros, filmes e seriados, ou quando escrevo meus textos aleatórios, do que quando tento pensar em coisas que realmente aconteceram. Minha imaginação é fértil, vivo sonhando acordada… Já me peguei sem certeza se algumas das minhas lembranças foram reais ou se eu só sonhei. E em certas situações que ficaram mal resolvidas na realidade, inventei desfechos mentalmente pra justificá-las pra mim mesma. Por mais estranho que seja, acho que às vezes é bom pensar em como gostaríamos que as coisas tivessem acontecido (mas com um olhar crítico, para não acabarmos enganando a nós mesmos, claro). Nos ajuda a aceitar melhor circunstâncias, com o tempo.
Acho que se fizessem um raio-x dos meus pensamentos não chegariam a conclusão alguma, assim como eu. Iam ver uma pessoa confusa por pensar demais (imaginei uma fumacinha saindo das engrenagens do meu cérebro, e aí passei a dispensar a hipótese de ser uma pessoa confusa, acho que vou adotar a de ser uma pessoa maluca mesmo [risos].). Talvez veriam que eu guardo demais, e lembro demais, na verdade, mal faço outra coisa. Questiono demais, e afirmo também. Crio expectativas, sonho, imagino…
Gostaria de ter um raio-x desses pra poder entender algumas atitudes alheias, e pra ver o ponto de vista das pessoas antes de julgá-las. E também pra ter que me explicar menos aos outros, esse diagnóstico ia facilitar muito.
A Bianca por ela mesma? Difícil dizer… Apenas diferente.
Minha palavra de ordem realmente é “superação”. Não me lembro direito de onde surgiu, faz muito tempo… Sou uma grande criadora de bordões. Então eu dizia algo do tipo “mas a gente releva” e acho que acabou se transformando em “a gente supera”. O pessoal gostou, e acho que depois de tanto falar, passei a acreditar nisso de fato. Eu não era de superar, na verdade, sempre ficava remoendo as coisas por muito tempo, vivendo de passado… Até que decidi mudar de vida, deixar pra trás tudo o que me fazia mal. E deu certo.
O primeiro passo é o mais difícil: querer que a mudança ocorra. Depois, é simples.
Hoje vivo na mudança constantemente, e o lance de “superar” funciona e muito. Mas claro, isso não me fez deixar de ser quem era: o lance da nostalgia sempre fez parte de mim. Porém, vi que todos, como eu, tinham problemas. A maioria, bem piores até, não havia motivo pra continuar assim tão triste, como sempre estava. Passei a aceitar que as coisas que me faziam chorar ontem, já me fazem rir hoje, e isso é um ciclo, acontecerá sempre.
Esse foi o aprendizado mais importante. Pouca coisa fica. E quando fica, pode saber… É pra valer! As melhores coisas ficam pra sempre guardadas em nossa memória e experiência, para serem levadas conosco rumo ao futuro, que para nós, sempre será incerto.