quinta-feira, 2 de junho de 2011

A FAVOR DO "PSICOTAPA"

Por Ana Manssour

Foto: Google Images
Imagino que vocês estejam sabendo do projeto de lei 2654 de 2003 que tem como principal objetivo proibir todo e qualquer castigo físico às crianças. Não vou fazer onda, nem usar meias palavras. Sou contra essa lei!

Não sei se já contei aqui, se já, peço desculpas pela repetição. Se não, segue em primeira mão: tenho quatro filhas, uma de 24 anos, uma de 20 e duas de 14 anos. Vale lembrar, que, graças a Deus, nunca pude me considerar pobre, mas, também, nunca fui rica. Eu sempre trabalhei fora, não só por vontade ou prazer, mas por necessidade também. Criar e sustentar quatro filhos, nos dias de hoje, não é uma tarefa fácil e muito menos barata. Nunca nos preocupamos com questões ligadas a grifes, pelo contrário, sempre procurei os saldões e as ruas de comércio atacadista para vestir e calçar as minhas filhas, de maneira a deixar as coisas mais fáceis, além de nunca termos nos feito de rogados ao aceitar roupas infantis de primeira ou segunda mão para ajudar no orçamento doméstico.

Portanto, quando digo que tivemos quatro filhas, estou dizendo que geramos, trouxemos à vida, criamos e educamos pessoalmente nossas filhas, com o apoio inestimável de empregadas e creches em épocas determinadas, bem como das avós, eventualmente, em casos de viagem ou de doença que exigisse maior atenção e cuidados. Não tivemos, pois, a “vantagem” de ter babás e enfermeiras se revezando no cuidado com as minhas filhas, embora tenhamos, meu marido e eu, contado com o auxílio eventual de faxineiras, empregadas e com o apoio dos nossos pais.

Também sempre acreditei que, como diz o velho ditado, “quem os pariu que os crie”. Ou seja, embora obviamente não se aparte os avós do processo, não é obrigação deles a criação e educação dos nossos filhos. Nossos pais e sogros são o nosso porto seguro, fonte de informações preciosas, de apoio nas horas difíceis, de alívio na exaustão, de manancial de carinho adicional para os netos, mas já cumpriram a sua responsabilidade em relação aos próprios filhos. Temos idade suficiente para agirmos e vivermos como adultos responsáveis.

Fico imaginando qual é a participação diária na criação e educação dos filhos que os senhores deputados que elaboraram a tal lei costumam ter. Se contratam as tais babás ou enfermeiras, se deixam com as avós ou em creches particulares de alto nível, ou um pouco de cada. Gostaria de saber se quando saem de casa pela manhã os filhos ainda estão dormindo, e se quando chegam de volta, à noite, os pimpolhos, bem alimentados e banhados, já estão de volta ao sono reparador da infância. Se aos finais de semana ficam com as crianças, convivendo, conversando, ensinando e dando exemplos, ou se continuam envolvidos com seus trabalhos, ou descansando merecidamente.

Gostaria de saber como esses deputados e deputadas ensinam os limites, os pode e não pode aos filhos, através diálogo democrático com uma criança de 1 ano e dois meses, que, é bom lembrar, ainda não fala, apenas balbucia algumas palavras). Quem tem ou já teve filhos, sabe que as crianças pequenas são extremamente curiosas e adoram fazer coisas que têm perigo potencial, como mexer no fogão, na privada, subir em lugares altos e instáveis. Ou, em pleno aprendizado a respeito de “até onde podem ir”, reagem com um tapa no rosto do pai, da mãe ou de um dos avós quando recebem uma negativa a alguma coisa que estão fazendo ou querendo.

Claro que sempre se começa pelas palavras. “Joãozinho, não mexe aí que faz dodói!” E o Joãozinho vai lá e mexe de novo. E a gente fala de novo. E o Joãozinho mexe outra vez, olhando para nós com a maior cara de satisfação. Adoro o número três. Esse é o número do “basta”. Se não ouvir desta vez e continuar insistindo, vai levar uma bela palmada no bumbum. Como o bumbum, até os dois anos, está bem recheada e protegida pelas fraldas, a palmada faz um estalo, um barulho que assusta, além do impacto. Mas não dói. Eles choram, mais provavelmente, pela clareza da mensagem de que “mexer onde faz dodói” não é uma coisa negociável, e precisam aceitar essa frustração. Talvez, mais tarde, em uns dez ou quinze anos, quando ele for mocinho...

Sou totalmente contra o espancamento. Seja contra crianças, seja contra animais, seja contra adultos ou idosos, homens ou mulheres. É o máximo da demonstração de poder a partir da força, de impotência de argumentação, de fraqueza de caráter. Além disso, sempre segui o raciocínio que, depois de uma certa idade, não se dá mais palmada em crianças. Afinal, eles, a partir de uns três anos, já têm um vocabulário bastante bem desenvolvido e uma capacidade de raciocínio bem mais desenvolvida. Portanto, têm condições de compreender uma conversa, desde que nos esforcemos para usar uma linguagem ao alcance do intelecto deles. Eles já têm condições de entender o que é um castigo como não poder brincar por um tempo com determinado brinquedo, ou assistir ao programa de televisão favorito.

É bom lembrar que o ser humano não nasce pronto. É bom lembrar que os seres humanos são indivíduos, inclusive em termos de personalidade, e isso já se manifesta desde tenra idade. É bom lembrar que É OBRIGAÇÃO DOS PAIS EDUCAR SEUS FILHOS para a vida familiar e para a vida em sociedade. E isso deve ser feito desde que nascem. Na verdade, na minha opinião, e por experiência própria, educam-se os filhos desde o ventre materno.

Se não fizermos isso, teremos cada vez mais legiões de jovens imaturos (que, é claro, viram adultos, e depois idosos...), donos de si e da verdade, que acreditam que podem, por exemplo, atear fogo em um mendigo por simples diversão, e que isso não faz mal a ninguém, não dói, não machuca e não tem conseqüências graves. Teremos mais e mais jovens que não vêem mal algum em fazer um calouro universitário chafurdar na lama. Veremos, a cada dia, mais pessoas agredindo pessoas, porque simplesmente não aprenderam os limites do certo e do errado. Cada dia mais teremos jovens que buscam as drogas e outros artifícios porque alguém ofereceu e eles entraram no jogo, porque não lhes foi ensinado com veemência que há certas coisas que são inegociáveis e que o resultado é devastador.


Vai ser pelo menos interessante ver esse projeto de lei sendo julgado pelo Senado. Justamente onde, sabe-se, há muitos pais e mães que carregam a culpa de não terem dado a atenção e a educação necessária aos seus filhos, quando era o tempo. Sabe-se que alguns dos jovens que andam por Brasília e outras capitais, hoje, praticando ações pouco louváveis, são justamente parte da prole dos senhores senadores e senadoras. Quem sabe se uma simples palmada sobre a fralda, na época certa, não teria prevenido o sofrimento desses pais e filhos que hoje estão por aí?


PS: Alguém notou que depois da notícia do projeto de lei começaram a pipocar notícias nos jornais sobre maus-tratos e abandonos a crianças pelos próprios pais? Será que essas coisas não aconteciam nunca e, assombrosamente, multiplicaram–se de um dia para o outro? Ou que ninguém denunciava porque não havia uma lei específica para isso? Ou será que há uma campanha disfarçada em prol da lei da palmada que começou a ir atrás dessas notícias para estimular a aprovação?