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"Dizem que sou louco por pensar assim
Se eu sou muito louco por eu ser feliz
Mas louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz
Mas louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz
(...) Sim sou muito louco, não vou me curar
Já não sou o único que encontrou a paz
Mas louco é quem me diz
E não é feliz, eu sou feliz"
Já não sou o único que encontrou a paz
Mas louco é quem me diz
E não é feliz, eu sou feliz"
Ele é completo. Mais que um cantor, um artista com todos os bons adjetivos permitidos. Nascido em 1º de agosto de 1941 na pequena cidade de Bela Vista, no Mato Grosso do Sul, fronteira com o Paraguai, Ney de Souza Pereira desde cedo demonstrou vocação artística: cantava, pintava, interpretava.
Criança, escolheu o caminho do questionamento das reticências do mundo adulto, inconformando-se com seus preconceitos e incoerências. Segundo consta em sua biografia, teve a infância e a adolescência marcadas pela solidão, em parte voluntária - pois adorava passar horas seguidas no mato, acompanhado somente por seus cachorros - e por outra parte forçada, pelas constantes mudanças da família, decorrentes das transferências de seu pai militar.
Até completar 17 anos, sua família morou, além de Bela Vista, no Recife, em Salvador, no Rio de Janeiro e em Campo Grande. Quando deixou a casa da família para entrar na Aeronáutica, Ney ainda não fazia idéia do que faria de sua vida. Gostava de teatro e cantava esporadicamente, mas acabou indo trabalhar no laboratório de anatomia patológica do Hospital de Base de Brasília, a convite do primo. Tempos depois, passou a fazer recreação com crianças.
Nessa época, foi convidado para participar de um festival universitário e chegou a formar um quarteto vocal, sob protestos da professora de canto e apesar do regente do coral do qual fazia parte elogiar sua voz especial.
Depois do festival, fez de tudo um pouco, até atuou em um programa de televisão. Também concentrou suas atenções no teatro, decidido a ser ator. Atrás deste sonho, ele desembarcou no Rio de Janeiro em 1966, onde passou a viver da confecção e venda de peças de artesanato em couro. Ney adotou completamente a filosofia de vida hippie.
Neste período, viveu entre o Rio, São Paulo e Brasília, até conhecer João Ricardo, através da grande amiga Luli, que mais tarde tornou-se compositora de alguns de seus maiores sucessos. João procurava um cantor de voz aguda para um conjunto musical. e convidou Ney para ser o cantor do grupo. Ele mudou-se para São Paulo, de encontro a um ano de exaustivos ensaios, que entremeou com a participação em espetáculos teatrais e o artesanato. Começou a se revelar, então, Ney Matogrosso. O nome artístico, ele resgatou na própria família: seu pai tinha Matogrosso no sobrenome.
Em 1970, foi para o Rio de Janeiro e, convidado para participar do Secos e Molhados, pediu demissão em Brasília, sem saber se ia dar certo ou errado. Ouviu coisas do tipo: "Você é louco em pedir demissão. E o seu futuro, sua garantia, sua estabilidade? Você está perdendo toda a segurança que adquiriu." Segurança... "eu posso morrer daqui a meia hora! Não estava preocupado com isso. Eu queria viver a minha vida".
Com o Secos e Molhados viajou inteiramente o Brasil. Os shows eram tantos que tornaram-se incontáveis. Em todos os lugares, apresentações para grandes multidões. Em seu site, explica que "o repertório era composto principalmente pelo João Ricardo. Eu dava muitos palpites, ensaiando. Ensaiávamos basicamente com dois violões - um normal, do Gérson (Conrad), e outro de 12 cordas, do João. Eu adorava o repertório. O conceito era a palavra, eram basicamente poemas musicados. Era essa a nossa grande distinção. No nosso repertório estavam poemas do pai do João Ricardo, o famoso poeta português João Apolinário. Nossa postura era de rock, mas não faziamos rock'n'roll. Nossa postura era desafiadora, transgressora, mas o repertório era pop".
Depois, seguiu carreira solo. Com sua experiência, sensibilidade e releitura, interpretou maravilhosamente bem Cartola e Chico Buarque. E se reinventou de múltiplas formas. Do pop ao clássico. Mais que eclético, Ney é uma pessoa, um artista de atitude. Aposta naquilo que acredita, e enfrenta o desafio.
De vez em quando parece sumido. Mas por sorte do público, nunca por tempo suficiente. Ousado, arrisco a dizer que aos moldes de Secos e Molhados, apresentou “Inclassificáveis”, o seu até então último espectáculo - de música popular brasileira com uma roupagem pop, em todos os sentidos.
O reportório abarcou canções novas e clássicos da MPB: “O Tempo não pára” (Cazuza), “Divino e Maravilhoso” (Caetano Veloso), “Um Pouco de Calor” (Dan Nakanawa), “Ouça-me” (Itamar Assunção) e “Inclassificáveis” (Arnaldo Antunes) estão entre as músicas escolhidas por Ney Matogrosso. O novo espectáculo contou com figurino de Ocimar Versolato e cenário de Milton Cunha.
Em Outubro de 2007, quando estreou
Alguns meses depois, em Janeiro de 2008, Ney Matogrosso levou “Inclassificáveis” para o Rio, depois de percorrer algumas cidades, e o sucesso foi ainda maior. Chegou a Portugal e seguiu. Ney é para sempre - e sem fronteiras.