segunda-feira, 13 de junho de 2011

Festa junina

por Dade Amorim



Um cheiro muito apetitoso vinha das barraquinhas da direita. Resolveu ir até lá averiguar o que seria. Verdade que vinha de mistura com os cheiros de pipoca e cachorro quente, mas era mais forte, mais atraente, e o estômago dava sinais de ansiedade. Contornou a barraca de prendas, que exibia uma jarra de louça horrenda, bonecas de vários tamanhos e tipos, caixas de jogos, pratos pintados e um urso gigantesco de pelúcia amarela, além das flores de plástico. A música do sanfoneiro contratado na feira de São Cristóvão se juntava ao vozerio das pessoas, vestidas ou não a caráter, e às risadas de pequenos grupos de bebedores de quentão, ao lado da churrasqueira. Que aliás estava invisível, por trás das fileiras de gente com tíquetes na mão.
Lembrou esse detalhe decisivo e voltou alguns passos à esquerda, em direção às caixas. Havia outra fila, é claro, e ele resolveu passar o tempo apreciando as meninas que pareciam se divertir muito na barraquinha da pesca. Eram umas seis ou sete, todas de saias coloridas e blusas decotadas, e uma delas, que estava de branco, um véu curtinho e espetado no alto da cabeça, tinha posto o buquê de flores coloridas debaixo do braço para poder manejar o anzol. Logo exibia uma pequena luminária excessivamente dourada, seu prêmio na pescaria. Um bando de crianças chegou com grande alarido, e agora disputava com as moças os melhores lugares para pescar. Elas se afastaram ruidosamente, gritando para outros grupos que estava na hora do casamento e perguntando pelo noivo.
A vez dele demorava. A sua frente, uma jovem de camisa xadrez e calça de brim esfarrapada mastigava uma maçã do amor, cujo cheiro doce o provocava. Teve ímpetos de pedir uma dentada, mas era um rapaz tímido e teve medo de ser mal interpretado. Alguém passou por ele e deixou um rastro de perfume barato misturado a um forte cheiro de corpo suado. Era o noivo, de fraque listrado e polainas brancas sobre sapatos muito grandes para seus pés. “Parece mais um palhaço”, ele pensou, já sem vontade de sorrir, porque a fome aumentava a cada passinho minúsculo em direção à caixa.
O alto-falante convocava o noivo, que comparecesse logo diante do padre e do juiz, postados diante de um altar de papelão pintado de cores berrantes. “A noiva já está aqui, seu safado!” – gritava o pai da dita, de chapéu de palha desfiado e gravata vermelha. Um grupo se formou diante do altar e três rapazes chegaram empurrando o noivo. O barulho agora era ensurdecedor, porque o sanfoneiro atacava uma marcha nupcial repinicada e o sistema de som sibilava em vários tons.
A vez dele chegou, afinal, e assim que o papelzinho branco passou para sua mão, correu para a churrasqueira, agora um pouco mais vazia, pois todo mundo corria para ver o casamento rindo por antecipação.
“Picanha?” – perguntou o churrasqueiro. “Só daqui a meia-hora. Tou pondo a carne no espeto agorinha, vai esperar um pouco. E churrasqueiro também é filho de Deus. Vou lá ver o casório, que esses caras são hilários.” Dito isso, o sujeito largou o espeto na brasa e saiu zoado. Ele considerou a situação e o estado de sua fome, e decidiu: passou a mão em uns drumetes meio chamuscados e numas linguiças tostadas. Depois rumou para as bebidas e saiu com sua latinha de coca-cola sem que ninguém lhe perguntasse nada. Aproveitou uma das mesinhas vazias e mandou ver. Na mesinha ao lado, a luminária dourada faiscava, largada debaixo de um refletor.