sexta-feira, 3 de junho de 2011

Marco Polo: o mundo em vozes e silêncios.

por Lilian Zaremba


Você acorda, toma café e sai para trabalhar.
Retira seu carro da garagem ou anda pela rua até o ponto de ônibus, metrô ou trem. Ocorre a você que todo esse percurso pode ser uma aventura ?
Há mais de 700 anos atrás Marco Polo saiu de sua casa para trabalhar. Seu trabalho entrou para a História como grande aventura. Até que ponto ele sabia disso ?
Um aventureiro na rota da seda, atravessando mares e territórios, conhecendo reis, rainhas, homens dignos e indignos. Marco Polo, o italiano de Veneza, descreveu o que viu com seus próprios olhos.
Mas será que viu mesmo ?
Sem dúvida, muitas coisas não viu.
Em seu livro, intitulado “A descrição do Mundo” publicado vinte e cinco anos depois desta longa viagem, escreveu:
...não vi mas obtive as informações de homens dignos de serem acreditados ... de forma que nosso livro seja sincero e verdadeiro, sem nenhuma mentira e que seus propósitos não possam ser taxados de fábulas.
Marco Polo descreveu o mundo para seus contemporâneos ao mesmo tempo que continua descrevendo este mundo para nós, em sua disposição por viver aventuras.
Aventura de viajar, não necessariamente para o Oriente de Marco Polo mas através do Oriente de Marco Polo, renovando essa aventura que no século 20 virou ópera pelas mãos de um chinês.

Você compõe a música ou a música compõe você ?

Tan Dun diz que realmente não consegue responder a essa pergunta ... um monge me colocou esta questão quinze anos antes de eu começar a compor a música para a ópera Marco Polo ... eu penso que sons e diferentes culturas acabam guiando meu trabalho, me levando por uma longa jornada, antes mesmo que eu possa refinar tecnicamente a escrita da música...

Tan Dun nasceu em Huan, em 1957.

Depois de passar dois anos plantando arroz, durante a Revolução Cultural Chinesa, consegue trabalho como violinista numa trupe de Ópera em Pequim.
Aos dezenove anos ouve uma sinfonia de Beethoven pela primeira vez, este o momento de começo da aventura: decide ser compositor e apenas um ano depois já está no Conservatório de Pequim, um pulo para uma bolsa na Universidade de Columbia, em Nova York. Seria nesta cidade norteamericana que Tan Dun completaria seu doutorado e fixaria residência.

Uma ópera dentro de uma ópera

Esta jornada leva Tan Dun através dos cantos medievais e das canções da Mongólia, da música Ocidental até a Ópera de Pequim; da Orquestra até a cítara, flautas de bambu ou cornetas do ritual Tibetano ... a fusão destas sonoridades de todas as esquinas do globo terrestre é a definição que Tan Dun pode fixar em sua ópera Marco Polo, e ainda pergunta ...
Será que a viagem de Marco Polo poderia acontecer hoje ?
Será que alguém sonha com esta viagem? Ou será que a jornada nos imagina ?
Você é a borboleta ou a borboleta é que é você ?

Perguntas feitas a um sonhador. Ou a um artista que sabe fazer outros sonhar ...
Leste e Oeste, Oriente e Ocidente, Marco Polo é uma ópera dentro de uma ópera. Uma aventura da escuta construída por Tan Dun e apresentada pela primeira vez em 1996, na Bienal de Munique. Comissionada pelo Festival de Edimburgo e tendo também o apoio da Mary Flager Trust e da Fundação Rockefeller, a ópera de Tan Dun foi gravada ao vivo em Amsterdam, 1996.

Muito mais se poderia falar sobre o compositor e sua obra, mas o importante a destacar aqui é sua proposta para a forma denominada “ópera” no século 21: utilização do clássico, multimídia e sistemas musicais do Oriente e Ocidente. Um artista que ainda jovem já conseguiu encontrar sua própria voz e linguagem, transcendendo a simples fusão de culturas para fazer música com todas as informações da atenção humana: vozes, espaço e silencio.

sugestão de escuta :

A integral, com duração de duas horas sem intervalos, da ópera “Marco Polo”, composta por Tan Dun e com libretto do crítico britânico Paul Griffiths. Apresentando o tenor dramático Thomas Young como “Polo” e a mezzo-soprano Alexandra Montano, como “Marco”, e ainda o baixo Dong-Jian Gong, no papel de Kublai Khan. Orquestra de Câmara da Radio Netherlands e Capella Amsterdam, regência do próprio compositor Tan Dun.

Para ver: