quinta-feira, 11 de agosto de 2011

CORRESPONDÊNCIA URBANA

 Por Stella Cavalcanti

Eu conheço Gisele Scantlebury desde o século passado. Faz tempo, ô, se faz. Ela ainda era Gisele Freire e a gente se conheceu num canal do mIRC, o #altoastral. Para quem é do tempo do twitter, o mIRC é um dos antepassados dinossáuricos das redes sociais.
A amizade saiu da tela, veio para a vida real e seguiu por casamentos, mudanças de cidade e de país e agora tem mais uma participante na história a Lia, filha da Gisele e do Paul, seu marido neozelandês.  


Gisele Scantlebury por ela mesma:

Sou jornalista por formação e pitaqueira por opção. Poderia escrever horas a respeito da minha excelente personalidade (risos!), meu senso de humor (às vezes um pouco ácido) e outros atributos, mas hoje em dia acho que a coisa que me define mais é que sou mãe da Lia, que tem 17 meses de vida. Nunca pensei que ser mãe me mudaria tanto e alteraria a forma como vejo o mundo e como me relaciono com ele. Gosto de sair com meus amigos, mas não sou baladeira. Minha carruagem vira abóbora pouco depois das 10h da noite. Nem sempre foi assim, quando conheci a Stella, ficava até tarde na farra mesmo quando tinha que começar a trabalhar na rádio às 5h da matina. Adoro música e cinema. Ah! Também gosto de assistir tevê, adoro seriados sobre crime e um bom drama. Nossa, esse negócio de falar de mim mesma é mais difícil do que eu imaginava. 


Gisele, 
Escrevo cheia de saudade e curiosidade. Nossa amizade vem do século passado, cheia de risadas e algumas barras, entra neste século com a nossa vida mudada, de recém-formadas com o futuro pela frente à sensação de que já andamos muito, e que há muito ainda para caminhar. Ambas saímos da nossa terra: eu fui mais comedida e vim de Recife pro Rio de Janeiro, já você abriu as asas e voou pro outro lado do mundo... 

Me conta, amiga: como é a experiência de ter morado em três países nos últimos dez anos? Aliás, já faz todo esse tempo mesmo que você saiu do Brasil? Nos países onde morou, você contou com a ajuda da comunidade brasileira que já estava lá?

E como foi mudar - como eu mudei - a profissão? De publicitária, virei confeiteira, de jornalista você passou a trabalhar com educação infantil... E, nos países que você morou, tão diferentes da nossa cultura, quais as principais diferenças das crianças daí para as daqui? Agora, como mãe, você pode ver os dois lados da questão, não é?


E quais os seus planos para vir para o Brasil, que é prá eu poder conhecer minha sobrinha? :)

Um abraço, 

Stella

Oi, Stella!


Saí do Brasil em janeiro de 2004 e não tinha idéia do que me aguardava... Não tinha muito dinheiro, não tinha feito muitos planos. Um despreparo total! Eu só queria sair do Recife naquele momento e acho que não pensei muito no que isso envolvia. Ainda bem porque, do contrário, acho que não teria coragem para ter feito o que fiz. Hoje me considero uma pessoa de sorte porque nessa minha aventura tudo aconteceu no seu tempo certo e não passei por muitos aperreios.

Acho que o primeiro ano foi o mais difícil, com direito a momentos deprê mas foi fácil esquecer o começo espinhoso depois que conheci o Paul, meu marido. Em Auckland (Nova Zelândia), a primeira cidade onde morei fora do Brasil, tive a sorte de ter o apoio da Roberta Queiroga, amiga desde o tempo do segundo grau (ainda se fala segundo grau?). Ela foi me apresentando aos amigos dela e, aos poucos, estava rodeada de gente bacana e que morava fora do Brasil há mais tempo do que eu. Confesso que nesse primeiro ano, eu estava mais voltada em viver a cultura local e fazer amigos neozelandeses porque a idéia era aprender inglês (eu não falava quase nada).

Depois, mudei para Tóquio (Japão) porque o Paulo foi transferido. Em Tóquio, sem dúvida, a ajuda dos brasileiros foi fundamental. Novamente, tive a sorte de começar a trabalhar em um jornal brasileiro. Foi tudo de bom! Eu conseguia me virar com o inglês, mas, nossa, os amigos brasileiros salvaram minha pele muitas vezes, sem falar que como o País tinha uma comunidade brasileira grande, eu me vi rodeada de produtos brasileiros - coisas que não via desde de 2004.

E, finalmente, mudamos para Melbourne (Austrália). Aqui foi mais difícil encontrar brasileiros que estivessem no mesmo momento de vida que eu porque muitos são estudantes e estão aqui de passagem. Mas acabei encontrando uma galera legal e tive a sorte de conhecer muitas outras brasileiras casadas e com filhos. Hoje nossos filhos brincam juntos e a gente tenta manter a cultura brasileira e a língua portuguesa presentes na vida das crianças.


Na Nova Zelândia e aqui na Austrália, as pessoas tem uma coisa que eu acho muito legal que é deixar a criança ser criança. Eles não são tão apressados com questões como aprender a ler, a escrever. Tenho amigas aqui que foram professoras no Brasil - ou têm alguma idéia de como funciona o processo educacional no Brasil - e elas acham um absurdo que as crianças só fazem brincar na creche. Tirando o pouco do exagero porque eles fazem atividades educacionais e artísticas, eu acho que isso é bacana. As criaturinhas vão ter o rosto da vida para aprender um monte de coisa, então, deixa elas curtiram esse momento. Isso eu gosto!

Também acho que elas, as crianças, aprendem um pouco mais sobre a conveviência em socidade. Elas falam obrigada, por favor, com licença, desculpa. Uma coisa que não gosto é que eles têm muito medo de traumatizar as crianças, então, de vez em quando rolam um exageros como discutir se a história da Cinderela pode ser nociva. Pois é, acreditem! Às vezes eles tentam envolvê-las em uma bolha e isso acaba sendo prejudicial também.

Com relação ao Japão, acho que existe uma preocupação grande com disciplina, com o respeito ao próximo. Os japonezinhos aprendem desde cedo que é preciso aprender a conviver com os outros sem causar transtornos, obecendo normais e leis. Não são robotizados, com muitas pessoas pensam, e, como toda criança, demonstram afeto e adoram um carinho. Ou seja: criança é criança em qualquer lugar do mundo. E quanto à viagem para o Brasil, é uma boooooa pergunta. Quero muito ir no ano que vem, então, fique aí na torcida.

Um abraço,

Gisele