quarta-feira, 24 de agosto de 2011

HELLO DOLLY!

A QUIETUDE DE DOMINGO

Por Dorothy Coutinho

Sob a pressão do ter de parecer, ter de participar, ter de adquirir, ter de qualquer coisa, assumimos obrigações desnecessárias, outras impossíveis, e aquelas que nem combinam conosco nem nos interessam. Na cultura da agitação e do barulho, gostar de sossego tem sido uma excentricidade.
Àqueles que não se submetem, mas questionam, os que pagam o preço de uma relativa autonomia, ou que não se deixam escravizar, pelo menos sem alguma resistência, para esses não há perdão nem anistia. Ficarão do lado de fora da ciranda! Quem não corre com a manada vai parar numa jaula: um animal estranho. Ficar sossegada tem sido até perigoso: pode ser doença.

É indispensável circular, se atualizar, ser produtiva, estar bem informada e enturmada mesmo que seja com a turma errada.

Estar sozinho é considerado humilhante, sinal de que não se arrumou ninguém – como se amizade ou amor se “arrumasse” na loja de 1,99. Para o homem pode até ser um momento libertário: ninguém pendurado nele controlando, cobrando, chateando. Enfim, livre! Mas para a mulher, não. Na nossa mente preconceituosa é sempre porque está abandonada: ninguém a quer. Nada disso gente! Além do desgosto pela solidão, nutrimos o horror à quietude. Logo pensamos em depressão! Santo Deus, quem sabe uma terapia, um pai de santo, um antidepressivo!!!! Isso lembra a criança que não brinca, não salta, e nem participa de atividades frenéticas: naturalmente está com algum problema. Ora, francamente!

O silêncio nos assusta porque retumba no vazio que temos dentro de nós. Quando nada se move nem faz barulho passamos a notar as frestas pelas quais nos espiam coisas incômodas e mal resolvidas. É outro ângulo de nós mesmos, geralmente nem percebido e nada valorizado, algo além de quem paga contas, transa, ganha dinheiro, come, envelhece, e um dia – mas isso é só para os outros – vai morrer!

Essa idéia nos assusta, por isso queremos ruído, ruídos. O silêncio remexe águas paradas, traz à tona e só Deus sabe os nossos desconsertos.

Mas quando aprendemos a gostar um pouco de sossego, descobrimos regiões nem imaginadas, questões fascinantes e não necessariamente ruins, como por exemplo, a experiência que tive quando alguém, hoje com 102 anos de vida, botou a mão no meu ombro de menina e disse-me: - Fica quietinha.. Um momento só, escuta a chuva chegando! E ela chegou intensa e lenta, como nessa madrugada de domingo, tornando tudo singularmente novo. A quietude de domingo pode ser como essa chuva: nela a gente se refaz para voltar mais inteira ao convívio, às tantas frases, às tarefas, aos amores e tudo o que fala além das palavras de todos os textos.