FESTIVAL DO VALE DO CAFÉ - VASSOURAS E ADJACÊNCIAS
Por Vera Guimarães
Fui pela segunda vez ao Festival do Vale do Café, que neste ano de 2011 está em sua 9a. edição.
A chamada região do Vale do Café, ou do Vale do Paraíba, compõe-se de 14 municípios da região serrana do Rio de Janeiro. Vejam aqui no site da PRESERVALE o mapa da região .
"A história do ciclo do café se confunde com a própria História do Brasil, especialmente na segunda metade do século XIX, um momento de transformações conjunturais decisivas para os períodos posteriores da vida de nosso país. Ela reúne, no espaço de pouco mais de um século, o apogeu e a ruína de um importante ciclo econômico do Brasil ocorrido em meio à transição política para a República, o fim do modo de produção escravocrata e a crise de desenvolvimento que se configurou nas primeiras décadas do século XX." (do site da PRESERVALE)
Em resumo, por essa época, segunda metade do século XIX, muito do patrimônio local, representado pelas fazendas e pelas cidades, mergulhou na decadência.
Na década de 1970 registrou-se o começo do interesse por esse patrimônio e novos proprietários se ocuparam principalmente da preservação e restauro das fazendas. A criação do PRESERVALE, em 1994, ensejou várias iniciativas para reavivar a região, entre as quais o FESTIVAL DO VALE DO CAFÉ. Aqui a programação de 2011.
Ficamos sediados em Vassouras, e de lá partíamos para as fazendas ou para outras cidades a fim de assistir aos concertos e/ou visitar as propriedades. Em cada uma das cidades há também uma programação gratuita, com palcos armados em praça pública, onde artistas famosos ou grupos locais se apresentam.
Vassouras é agradável, é possível passear a pé pela cidade, observando o que restou do casario do período colonial e as preservadas construções do século XIX, seu calçamento de pedra, sua antiga (nem tanto, 1856) estação ferroviária, ah, que pena que já não seja mais uma estação ferroviária.
estações ferroviárias.
Visite a Casa da Hera, , que guarda a memória dos negócios do café, mas principalmente a história de uma mulher à frente de seu tempo. Por coincidência, recentemente uma amiga falou entusiasmada sobre um livro que acabara de ler, exatamente a história de Eufrásia Teixeira Leite, mulher independente que, após a morte dos pais, se dedicou a gerir a fortuna da família, o que fez magistralmente e de forma inovadora, investindo na bolsa europeia. Nunca se casou e teve um romance com ninguém menos que Joaquim Nabuco. O livro é este aqui: http://www.sinopsedolivro.com/2009/07/mundos-de-eufrasia.html
Cada uma das fazendas abertas à visitação e/ou para os concertos do Festival tem seu jeito peculiar de receber os turistas. Há proprietária que se incumbe pessoalmente da recepção dos visitantes e se veste à moda antiga; outro monta um sarau histórico, empregando professores-atores, que encenam algum episódio ou o cotidiano do período enfocado; na Fazenda Cachoeira Grande, por exemplo, foi uma professora de história quem nos contou os fatos relativos à construção, decadência e restauração da propriedade.
fazenda cachoeira grande
Mesmo maravilhando-nos com todo o fausto e opulência das propriedades dos barões do café, é impossível não nos lembrarmos da forte presença dos escravos, que tornaram tudo aquilo possível. É parte destacada do Festival o evento denominado Cortejo de Tradições, “de valorização das raízes culturais do Vale do Paraíba Fluminense, que se destaca pela beleza e encantamento dos grupos de cultura popular presentes na região, considerada um dos berços da diversidade cultural brasileira.”
Tivemos oportunidade de ver, num ginásio, a concentração desses grupos de Folia de Reis, Jongo, Caxambu, Capoeira, Maculelê e muitos outros. Dava para ver a alegria das famílias, que ali registravam com seus celulares e câmeras digitais as fantasias e evoluções dos atores. Vê-los depois a desfilar, com alegria e orgulho, em direção à praça da matriz, enche nossos corações de emoção e respeito.
Já na praça, cada grupo escolhe um ângulo e ali fica a cantar e dançar. Fiquei horas observando-os e me concentrei no Jongo Renascer, composto de homens e mulheres, adolescentes e crianças. Sem qualquer traço de inibição, uma criança pequena pede licença à dançarina no centro da roda e assume o lugar dela, e passa a fazer par com um homem que parece pertencer ao topo da hierarquia do grupo. Em seguida, um adolescente pede licença ao adulto e toma seu lugar. E assim por diante, como observou uma companheira de viagem, numa integração familiar e comunitária invejável, que já não se vê mais.
Os grupos reverenciam o passado e a memória dos que tombaram na luta pela liberdade, mas encaram o presente com esperança e afirmam que “Pôr fim às desigualdades e respeitar as diferenças é o novo paradigma de todas as sociedades. (...) se, por um lado, o Cortejo de Tradições situa o Brasil no seu tempo histórico, também antecipa o futuro que se deseja, pois representa a sublime expressão da harmonia nas diferenças.”
Festival Vale do Café
Visitar a região, acompanhar o Festival, assistir aos concertos de artistas admiráveis, seguir o Cortejo de Tradições, tudo merece ser repetido. É o que eu pretendo fazer. Vamos?
